Golpe do IPVA 2025: criminosos oferecem desconto em link falso para motoristas. Saiba como se proteger

Criminosos estão utilizando links falsos para aplicar golpes relacionados ao pagamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) de 2025. A empresa de segurança digital Kaspersky identificou pelo menos 15 domínios usados para enviar mensagens SMS com links de sites fraudulentos que simulam a cobrança do imposto.

IPTU 2025: veja prazos e condições de pagamento em 20 municípios do Estado do Rio Alteração na tabela: Confira como ficam os valores do seguro-desemprego em 2025

A vítima é atraída pela promessa de um desconto de 45% no pagamento do IPVA. Na mensagem, os criminosos usam um endereço eletrônico com domínio “.org” para dar aparência de site oficial.

Após clicar no link, mais uma tática para criar uma falsa sensação de segurança: ao digitar os dados da placa, todos os dados do veículo aparecem no site.

Print do site falso usado por criminosos — Foto: Divulgação/ Kaspersky

Com a confiança da vítima conquistada, a plataforma solicita o número de CPF do contribuinte com a justificativa de que a informação é uma etapa do procedimento para o pagamento da cobrança. Segundo a Kaspersky, o dado será utilizado para possíveis futuros golpes.

A última etapa da fraude é o pagamento falso do IPVA por QR Code do Pix. Na verdade, o dinheiro é transferido para uma conta de titularidade dos criminosos.

Print do SMS com o link falso enviado para as vítimas — Foto: Divulgação/ Kaspersky

Para Fabio Assolini, diretor da Equipe Global de Pesquisa e Análise da Kaspersky para a América Latina, esse golpe se aproveita da vontade de motoristas economizarem no pagamento do imposto, além de utilizar mecanismos para conquistar a confiança das vítimas.

“Este golpe foi a versão mais agressiva que encontramos de phishing (crime para obtenção de informações pessoais) utilizando IPVA como isca até o momento, pois ele se aproveita bastante de fatores que dão a sensação de veracidade, como o site “.org” que é idêntico a um site oficial e a exibição dos dados do veículo apenas com a inserção da placa”, alerta.

Como se proteger do golpe do IPVA?

Para evitar cair no golpe, a Kaspersky recomenda aos contribuintes a desconsiderar ofertas que parecem boas demais para ser verdade, pois descontos significativos e inesperados são um sinal de alerta. É importante verificar cuidadosamente os links antes de clicar e nunca inserir informações pessoais em sites suspeitos.

Além disso, evite fornecer dados pessoais e financeiros em páginas desconhecidas ou não verificadas. Sempre confirme informações diretamente com fontes oficiais, como órgãos governamentais, para garantir a autenticidade de cobranças relacionadas a impostos.

Manter o antivírus atualizado ajuda a identificar links maliciosos e sites falsos. Por fim, o motorista precisa se manter informado sobre as táticas de phishing para reconhecê-las e evitar compartilhar mensagens suspeitas para não espalhar possíveis golpes.

A Secretaria estadual de Fazenda também fez um alerta para golpes envolvendo o IPVA. No ano passado, a pasta afirmou ter recebido “denúncias de contribuintes direcionados para sites falsos que geram boletos fraudulentos ou incentivam pagamentos via Pix, modalidade não aceita pelo Fisco Estadual”. Em casos suspeitos, a orientação do governo do estado é procurar a Polícia Civil.

Pagamento de IPVA no Estado do Rio

Desde o dia 8 de janeiro pode ser emitido o Documento de Arrecadação do Estado do Rio de Janeiro (Darj) para o pagamento do IPVA 2025. A emissão poderá ser feita no Portal do IPVA da Secretaria estadual de Fazenda ou na página do Bradesco.

Como já aconteceu em anos anteriores, o pagamento do IPVA 2025 poderá ser feito à vista, com desconto de 3%, ou parcelado em três cotas mensais iguais, sem abatimento. Vale lembrar que veículos com mais de 15 anos de fabricação ficam isentos do pagamento de IPVA.

Para emitir o documento, basta informar os números do Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam) e do CPF ou do CNPJ do proprietário. A GRD pode ser paga em qualquer banco, inclusive por meio de internet banking. O IPVA do Rio ficou, em média, 4,39% mais barato em 2024.

O calendário de vencimento do imposto começará no dia 22 de janeiro, quando vencerá a cota única ou a primeira parcela do imposto para veículos com placas terminadas em 0. A última parcela vai vencer em 11 de abril, para automóveis e motocicletas com placas de final 9. Confira o cronograma completo abaixo.

Calendário do IPVA 2025 no Rio

Final de placa 0

Cota única ou primeira parcela – 22 de janeiro

Segunda parcela – 21 de fevereiro

Terceira parcela – 22 de março

Final de placa 1

Cota única ou primeira parcela – 23 de janeiro

Segunda parcela – 22 de fevereiro

Terceira parcela – 26 de março

Final de placa 2

Cota única ou primeira parcela – 24 de janeiro

Segunda parcela – 23 de fevereiro

Terceira parcela – 27 de março

Final de placa 3

Cota única ou primeira parcela – 25 de janeiro

Segunda parcela – 26 de fevereiro

Terceira parcela – 1º de abril

Final de placa 4

Cota única ou primeira parcela – 26 de janeiro

Segunda parcela – 27 de fevereiro

Terceira parcela – 2 de abril

Final de placa 5

Cota única ou primeira parcela – 29 de janeiro

Segunda parcela – 29 de fevereiro

Terceira parcela – 4 de abril

Final de placa 6

Cota única ou primeira parcela – 30 de janeiro

Segunda parcela – 1º de março

Terceira parcela – 5 de abril

Final de placa 7

Cota única ou primeira parcela – 31de janeiro

Segunda parcela – 4 de março

Terceira parcela – 8 de abril

Final de placa 8

Cota única ou primeira parcela – 1º de fevereiro

Segunda parcela – 6 de março

Terceira parcela – 9 de abril

Final de placa 9

Cota única ou primeira parcela – 2 de fevereiro

Segunda parcela – 8 de março

Terceira parcela – 11 de abril

Saiba Mais:

Leitura labial: qual foi o motivo do riso de Obama e Trump durante o funeral de Carter?

Desfazer

Confirmada no ‘BBB 25’, Gracyanne Barbosa deleta perfil em plataforma adulta

Desfazer

Modelo diz ganhar ‘fortuna’ sentindo cócegas: ‘É sobre controle’

Desfazer

Mais recente Próxima Confira como ficam os valores do seguro-desemprego em 2025

Como a guerra da Ucrânia pode chegar ao fim em 2025

“Devo dizer que a situação está mudando drasticamente”, declarou o presidente da Rússia, Vladimir Putin, em sua coletiva de imprensa de fim de ano em dezembro. “Há movimento em toda a linha de frente. Todos os dias.”

No leste da Ucrânia, a máquina de guerra de Moscou está se movimentando gradualmente, quilômetro a quilômetro, pelos amplos campos abertos de Donbas, envolvendo e dominando vilarejos e cidades.

Alguns civis estão fugindo antes que a guerra os alcance. Outros esperam até que os projéteis comecem a explodir ao seu redor antes de empacotar os pertences que podem carregar e embarcar em trens e ônibus para um local seguro mais a oeste.

A Rússia está ganhando terreno mais rapidamente do que em qualquer outro momento desde que lançou sua invasão em grande escala em fevereiro de 2022, apesar do impressionante histórico de ataques assimétricos bem divulgados de Kiev contra seu poderoso vizinho.

Apesar de alguns sucessos ucranianos recentes, o país parece estar perdendo

À medida que a invasão chega ao final de seu terceiro ano, com um custo estimado de um milhão de pessoas mortas ou feridas, a Ucrânia parece estar perdendo.

Enquanto isso, na distante Washington, o imprevisível Donald Trump, que não é famoso por seu amor pela Ucrânia ou por seu líder, está prestes a assumir o comando da Casa Branca.

Parece um ponto de inflexão. Mas será que 2025 pode realmente ser o ano em que esse devastador conflito europeu finalmente chegará ao fim e, se for o caso, como será o desfecho?

‘Falar de negociações é uma ilusão’

A promessa de Trump de encerrar o conflito dentro de 24 horas após assumir o cargo é uma ostentação tipicamente grandiosa, mas vem de um homem que claramente perdeu a paciência com a guerra e com o envolvimento dispendioso dos Estados Unidos.

“O número de jovens soldados mortos nos campos de todo o lugar é impressionante”, disse ele. “É uma loucura o que está acontecendo.”

Mas o novo governo dos EUA enfrenta desafios duplos, de acordo com Michael Kofman, membro sênior do Carnegie Endowment for International Peace.

“Primeiro, eles herdarão uma guerra em uma trajetória muito negativa, sem um tempo enorme para estabilizar a situação”, disse ele em dezembro. “Em segundo lugar, eles vão herdá-la sem uma teoria clara de sucesso.”

O presidente eleito deu algumas pistas em entrevistas recentes sobre como pretende abordar a guerra.

Ele disse à revista Time que discordava “veementemente” da decisão do governo Biden, em novembro, de permitir que a Ucrânia disparasse mísseis de longo alcance fornecidos pelos EUA contra alvos dentro da Rússia.

“Estamos apenas aumentando essa guerra e piorando-a”, disse ele.

Em 8 de dezembro, ele foi questionado pela NBC News se a Ucrânia deveria se preparar para receber menos ajuda.

“Possivelmente”, respondeu ele. “Provavelmente, com certeza.”

Donald Trump prometeu encerrar o conflito na Ucrânia em 24 horas após assumir o cargo

Mas para aqueles que temem, como muitos temem, que o novo líder dos Estados Unidos esteja inclinado a se afastar da Ucrânia, ele ofereceu dicas de tranquilidade. “Na minha opinião, não é possível chegar a um acordo se você abandonar”, disse ele.

A verdade é que: As intenções de Trump estão longe de ser claras.

E, por enquanto, as autoridades ucranianas rejeitam qualquer conversa sobre pressão, ou a sugestão de que a chegada de Trump significa necessariamente que as negociações de paz são iminentes.

“Fala-se muito em negociações, mas isso é uma ilusão”, diz Mykhailo Podolyak, assessor do chefe do gabinete do presidente Zelensky.

“Nenhum processo de negociação pode ocorrer porque a Rússia não foi obrigada a pagar um preço alto o suficiente por essa guerra.”

O ‘exercício de estratégia inteligente’ de Zelensky

Apesar de todas as dúvidas de Kiev sobre negociar enquanto as forças russas continuam seu avanço inexorável no leste, está claro que o presidente Zelensky está ansioso para se posicionar como o tipo de homem com quem Trump pode fazer negócios.

O líder ucraniano não demorou a parabenizar Trump por sua vitória eleitoral e não perdeu tempo em enviar altos funcionários para se reunir com a equipe do presidente eleito.

Com a ajuda do presidente da França, Emmanuel Macron, Zelensky também conseguiu um encontro com Trump quando os dois homens visitaram Paris para a reabertura da catedral de Notre Dame.

“O que estamos vendo agora é um exercício de estratégia muito inteligente do presidente Zelensky”, disse seu ex-ministro das Relações Exteriores, Dmytro Kuleba, ao Conselho de Relações Exteriores dos EUA em dezembro.

Mudanças no controle militar da Ucrânia

Zelensky, segundo ele, estava “sinalizando construtividade e prontidão para se envolver com o presidente Trump”.

Com poucos sinais óbvios de que o Kremlin esteja fazendo gestos semelhantes, o governo de Kiev está claramente tentando sair na frente.

“Como Trump ainda não explicou completamente como vai fazer isso, os ucranianos estão tentando dar a ele algumas ideias que ele pode apresentar como suas”, diz Orysia Lutsevych, chefe do Fórum da Ucrânia na Chatham House.

“Eles sabem como trabalhar com esse ego”.

O Plano de Vitória: possíveis jogos finais

Mesmo antes da eleição nos EUA, havia sinais de que Zelensky estava procurando maneiras de reforçar o apelo da Ucrânia como um futuro parceiro para um presidente eleito como Trump, que é instintivamente transacional e relutante em continuar a garantir uma segurança europeia mais ampla.

Como parte de seu “Plano de Vitória”, revelado em outubro, Zelensky sugeriu que as tropas ucranianas, com experiência em batalha, poderiam substituir as forças dos EUA na Europa após o fim da guerra com a Rússia. Além disso, ele ofereceu a perspectiva de investimentos conjuntos para explorar os recursos naturais da Ucrânia, incluindo urânio, grafite e lítio.

Esses recursos estratégicos, alertou Zelensky, “fortalecerão a Rússia ou a Ucrânia e o mundo democrático”.

A Ucrânia sugeriu que seus soldados poderiam substituir as forças dos EUA normalmente estacionadas na Europa após o fim da guerra com a Rússia

Mas outros elementos do Plano de Vitória do líder ucraniano – a adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e seu apelo por um “pacote abrangente de dissuasão estratégica não nuclear” – parecem ter recebido uma resposta morna entre os aliados de Kiev.

A filiação à Otan, em particular, continua sendo um ponto de atrito, como tem sido desde muito antes da invasão em grande escala da Rússia.

Para Kiev, essa é a única maneira de garantir a sobrevivência futura do país, contra um inimigo russo voraz que pretende subjugar a Ucrânia.

Mas, apesar de ter declarado em julho passado que a Ucrânia estava em um “caminho irreversível para a plena integração euro-atlântica, incluindo a adesão à Otan”, a aliança está dividida, com os EUA e a Alemanha ainda não favoráveis à emissão de um convite.

O presidente Zelensky indicou que, se uma oferta de associação fosse estendida a todo o país, dentro das fronteiras internacionalmente reconhecidas da Ucrânia, ele estaria disposto a aceitar que ela se aplicasse, inicialmente, apenas ao território sob o controle de Kiev.

Isso, disse ele à Sky News em novembro, poderia encerrar a “fase quente” da guerra, permitindo que um processo diplomático abordasse a questão das fronteiras finais da Ucrânia.

Mas, segundo ele, essa oferta ainda não foi feita.

A posição instável de Kiev

Se não for a Otan, então o que será? Com a possibilidade de conversações de paz lideradas por Trump se aproximando e a Ucrânia perdendo terreno no campo de batalha, o debate internacional se concentra em reforçar a posição instável de Kiev.

“É fundamental ter garantias fortes, legais e práticas”, disse Andriy Yermak, chefe do gabinete do presidente Zelensky, à emissora pública da Ucrânia em 12 de dezembro.

O passado recente da Ucrânia, segundo ele, deixou um legado amargo. “Infelizmente, com base em nossa experiência, todas as garantias que tínhamos antes não resultaram em segurança.”

Sem mecanismos concretos semelhantes ao tipo de conceito de defesa coletiva incorporado pelo Artigo 5 do tratado de fundação da Otan, os observadores temem que não haja nada que impeça outro ataque russo.

“Zelensky entende que não pode simplesmente fazer um cessar-fogo puro e simples”, diz Orysia Lutsevych.

“Tem que ser um cessar-fogo mais. Seria suicídio para Zelensky simplesmente aceitar um cessar-fogo e não ter nenhuma resposta sobre como proteger a Ucrânia.”

Nos fóruns de políticas europeias, os especialistas têm procurado maneiras pelas quais a Europa pode ajudar a assumir essa pesada responsabilidade.

Soldados ucranianos da 68ª Brigada Jaeger continuam sua atividade militar em posições enquanto a guerra Rússia-Ucrânia continua na região de Pokrovsk

As ideias incluem o envio de forças de paz para a Ucrânia (uma proposta apresentada pela primeira vez em fevereiro passado por Macron) ou o envolvimento da Força Expedicionária Conjunta liderada pelos britânicos, que reúne forças de oito países nórdicos e bálticos, além da Holanda.

Mas Kofman é cético. “Garantias de segurança que não têm os Estados Unidos envolvidos como um dos garantidores são como uma rosquinha com uma metade gigante faltando.”

Essa é uma opinião que ecoa em Kiev.

“Que alternativa poderia haver? Não há alternativas hoje”, diz Podolyak.

Pedaços de papel, como o Memorando de Budapeste de 1994 (sobre as fronteiras pós-soviéticas da Ucrânia) ou os acordos de Minsk de 2014-15 (que buscaram acabar com a Guerra do Donbas) são inúteis, argumenta ele, sem a ameaça adicional de dissuasão militar.

“A Rússia precisa entender que, assim que iniciar uma agressão, receberá um número significativo de ataques em resposta”, diz ele.

Grã-Bretanha, Biden e o papel do Ocidente

Na ausência de um acordo sobre o futuro de longo prazo da Ucrânia, seus aliados estão fazendo o que podem para reforçar suas defesas.

Em dezembro, o secretário-geral da Otan, Mark Rutte, disse que “tudo” estava sendo analisado, inclusive o fornecimento de sistemas adicionais de defesa aérea, em parte para proteger a infraestrutura de energia danificada do país de uma nova onda de ataques coordenados de mísseis e drones russos.

Como a Ucrânia continua enfrentando uma grave escassez de mão de obra, o secretário de Defesa do Reino Unido, John Healey, disse que o governo poderia estar disposto a enviar tropas britânicas à Ucrânia para ajudar no treinamento.

Por sua vez, o governo Biden, que está deixando o cargo, parece determinado a entregar à Ucrânia o máximo de assistência militar aprovada pelo Congresso antes de deixar o cargo, embora os relatórios sugiram que talvez não haja tempo para enviar tudo.

Em 21 de dezembro, foi noticiado que Trump continuaria a fornecer ajuda militar à Ucrânia, mas exigiria que os membros da Otan aumentassem drasticamente seus gastos com defesa.

Os aliados de Kiev também continuaram a aumentar as sanções contra Moscou, na esperança de que a economia russa dos tempos de guerra, que se mostrou obstinadamente resistente, possa finalmente quebrar.

“Houve uma profunda frustração pelo fato de as sanções não terem simplesmente destruído a economia russa de forma irreparável”, disse uma fonte do Congresso dos EUA, sob condição de anonimato.

Depois de várias rodadas de sanções (quinze somente da UE), os funcionários do governo ficaram cautelosos quanto à previsão de seu impacto bem-sucedido.

Mas os indicadores recentes são cada vez mais alarmantes para o Kremlin. Com taxas de juros de 23%, inflação acima de 9%, queda do rublo e expectativa de desaceleração drástica do crescimento em 2025, as pressões sobre a economia russa raramente pareceram mais agudas.

Putin está se mostrando corajoso. “As sanções estão tendo um efeito”, disse ele durante sua coletiva de imprensa de fim de ano, “mas não são de importância fundamental”.

Juntamente com as perdas surpreendentes da Rússia no campo de batalha – autoridades ocidentais estimam que Moscou está perdendo uma média de 1.500 homens, mortos e feridos, todos os dias – o custo dessa guerra ainda pode levar Putin à mesa de negociações.

Mas quanto mais território a Ucrânia terá perdido – e quantas pessoas mais terão sido mortas – quando esse ponto for atingido?

Como Venezuela foi do ‘socialismo do século 21’ ao ‘capitalismo autoritário’ com Maduro

“Exproprie-se!”

O ex-presidente venezuelano Hugo Chávez (1954-2013) transformou esta ordem em seu grito de guerra. Em 2007, passou a usá-lo para anunciar a estatização de fábricas, bancos, hotéis, empresas de telecomunicações e energia, além de cinco milhões de hectares de terras.

As desapropriações foram um dos pilares de sustentação do novo modelo político, econômico e social promovido pelo mandatário no início dos anos 2000: o chamado socialismo do século 21.

Mas Nicolás Maduro – seu sucessor desde 2013, que se autoproclama “filho de Chávez” e defensor do seu legado – começou, sem muito alarde, a se afastar do projeto econômico do seu mentor nos últimos cinco anos.

Apesar dos questionamentos sobre sua legitimitdade, Maduro tomou posse neste 10 de janeiro. Deixou de lado os enfrentamentos com empresários que marcaram o governo Chávez e o início da sua própria gestão, optando por criar pontes com esse grupo.

“Para que serviu o conflito estéril, a guerra entre nós e não termos nos ouvido? Para o retrocesso e para causar prejuízos […] Vamos retirar a economia do antagonismo e da guerra política e nos concentrar em trabalhar para produzir”, falou o presidente venezuelano aos industriais e pecuaristas do país em julho passado.

A intenção era impedir que os conflitos políticos internos prejudicassem a economia da Venezuela.

Para isso, além das palavras, Maduro tomou medidas concretas. Nos últimos anos, devolveu centros comerciais e fazendas a seus proprietários originais e chegou a abrir a possibilidade de privatizar empresas estatais.

Em novembro, o presidente da Confederação Venezuelana das Indústrias (Conindustria), Luigi Pisella, declarou que o governo planejava transferir para o capital privado 350 empresas desapropriadas pelo Estado nas últimas duas décadas.

Todos estes gestos fazem crer que o país está consolidando um novo modelo, que alguns especialistas definiram como “capitalismo autoritário”.

Frente a protestos da oposição, Maduro iniciou o terceiro mandato em 10 de janeiro

Permanência da ‘elite governante’

Mas o que é o capitalismo autoritário e quais são suas características?

“É um sistema que permite ao capital privado enriquecer, mas, simultaneamente, os direitos sociais, econômicos e políticos dos cidadãos são enfraquecidos para favorecer a permanência das elites governantes no poder”, explica à BBC News Mundo, serviço de notícias em espanhol da BBC, o professor de ciência política Antulio Rosales, da Universidade York, no Canadá.

Em termos similares define o cientista político Guillermo Tell Aveledo, decano da Faculdade de Estudos Jurídicos e Políticos da Universidade Metropolitana de Caracas, na Venezuela.

Ele avalia, contudo, que o capitalismo autoritário venezuelano não é convencional.

“A ‘abertura’ carece de uma racionalidade econômica profunda, enquanto o sistema político permanece fechado e fortemente centralizado”, explica ele.

“Este sistema não representa uma ruptura com o socialismo do século 21, mas sim uma adaptação pragmática, que pretende perpetuar o poder sob novas condições.”

Nos últimos cinco anos, os venezuelanos observaram como, quase da noite para o dia, desapareceram os controles de preços e divisas vigentes desde 2003. O uso do dólar internamente foi descriminalizado, a economia foi dolarizada de fato, o que reduziu a inflação, e os trâmites de importação de bens foram simplificados.

Estas medidas colocaram fim à angustiante escassez de alimentos e remédios, causada tanto pelas regulamentações de preços, quanto pela má gestão das empresas estatizadas.

Proliferam hoje na Venezuela negócios criados para o consumidor de classe alta, principalmente na capital, Caracas. Estes empreendimentos não existiam no país há apenas cinco ou sete anos.

Mas, ao lado de um boom de consumo e luxo, os preços dos produtos também dispararam e milhões de pessoas mergulharam na pobreza.

O mal-estar social ante a histórica crise econômica vivida pelo país forçou as autoridades a abandonar algumas das políticas do socialismo do século 21

O pragmatismo

Os ajustes serviram para que o país saísse da sua histórica hiperinflação, iniciada em 2017, e para que sua economia atingisse 13 trimestres de crescimento consecutivos, segundo dados do Banco Central da Venezuela (BCV).

Para os especialistas consultados, esta mudança não foi produto de uma revisão ideológica, nem de retificações por parte das autoridades. Foi algo forçado pelas circunstâncias.

“A abertura se dá porque a receita do petróleo entra em colapso, devido à combinação da queda dos preços do produto nos mercados internacionais a partir de 2014 e da redução da produção nacional”, afirma o economista Francisco Monaldi, professor da Universidade Rice, nos Estados Unidos.

O petróleo é a principal fonte de divisas da Venezuela. O país extraía três milhões de barris diários no início do século, mas a produção caiu para meio milhão em 2020, queda que deixou o Estado sem mais de 90% de sua receita, segundo declarou Maduro no último mês de julho.

Queda da indústria petrolífera venezuelana é uma das principais causas das mudanças econômicas promovidas pelo governo do país, segundo os especialistas

“A falta de receita obrigou as autoridades a recorrerem àqueles que poderiam ter dinheiro e eram tradicionalmente considerados inimigos: os empresários”, explica o economista.

Rosales concorda que as mudanças econômicas foram impostas pela crise gerada pelo próprio modelo socialista, mas destaca um fator externo: as sanções impostas por diversos países ao governo de Maduro nos últimos anos por ataques à democracia e violações de direitos humanos.

“O governo teve seus caminhos bloqueados para dar prosseguimento ao socialismo baseado na receita, ou seja, vender petróleo no mercado internacional e redistribuir estes fundos internamente”, prossegue Rosales.

“Isso, somado às pressões internas [a insatisfação social e os protestos] causadas pela escassez e pela inflação, forçaram a geração de certas aberturas para manter o poder.”

A maior parte das sanções impostas nos últimos anos pelos Estados Unidos, União Europeia, Canadá e outros países foi dirigida a funcionários e ex-funcionários venezuelanos e seus familiares próximos.

Mas algumas dessas medidas tiveram como alvo a companhia estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA), o Banco Central do país e outras instâncias governamentais, que tiveram fechadas suas portas para os mercados internacionais tradicionais.

Já Monaldi acredita que as sanções internacionais foram apenas um ingrediente a mais.

“Em 2017, quando foram impostas as sanções financeiras [à PDVSA e ao BCV], a Venezuela estava a ponto de uma moratória financeira generalizada”, recorda o economista.

Monaldi defende que a razão fundamental da virada do governo foi a crise econômica “autoinfligida” que surgiu em 2017.

“A hiperinflação leva os governos a serem pragmáticos, incluindo os que são mais de esquerda”, segundo ele.

Como prova de suas argumentações, Monaldi menciona duas decisões que, segundo ele, teriam sido impossíveis de se imaginar dois anos atrás.

A primeira foi a aceitação de que a petroleira norte-americana Chevron administrasse sua empresa de capital misto com a PDVSA, o que é proibido pela legislação venezuelana. A segunda foi a concessão da empresa Ferrominera del Orinoco, a maior produtora de ferro do país, à companhia indiana Jindal.

As sanções pessoais também fizeram com que muitos empreendedores milionários investissem em negócios na Venezuela, criando a demanda doméstica por um consumo de alto valor que, até então, podia ser satisfeito no exterior.

As medidas liberais do governo de Maduro permitiram solucionar o problema da escassez de alimentos e retirar a Venezuela da hiperinflação

De inimigos a aliados

A mudança de atitude das autoridades em relação aos empresários, particularmente os tradicionais, traz consigo suas condições.

“Os empresários, principalmente os nacionais, sabem que existem regras que eles devem respeitar e uma delas é jogar com o governo”, destaca Rosales.

Isso significa que “os empresários não devem se intrometer em política – ou melhor, se forem se intrometer em política, que seja para apoiar as iniciativas do governo, não a oposição, nem outro tipo de dissidência”.

“Os empresários sabem que, se cumprirem com este ponto, abrem-se as portas às oportunidades de grandes lucros em certos mercados com enormes distorções”, prossegue o professor.

E os fatos confirmam suas palavras. Nos últimos cinco anos, também ocorreu uma mudança de atitude dos empresários em relação ao governo.

No passado recente, as principais associações empresariais haviam formado um bloco para enfrentar o chavismo nas ruas e nas urnas, em conjunto com os sindicatos, partidos políticos de oposição e outras organizações civis. Mas, agora, eles parecem ter se aproximado do governo.

“As relações institucionais entre o Executivo nacional, regional e municipal e todos os setores econômicos estão articuladas e trabalhando em conjunto para solucionar as dificuldades” econômicas enfrentadas pelo país, declarou em um comunicado a Federação de Câmaras e Empresas da Venezuela (Fedeindustria).

No documento, a organização rejeitou a possibilidade de que os Estados Unidos imponham novamente medidas contrárias ao setor petrolífero venezuelano, após as críticas ao governo de Maduro devido às eleições presidenciais de 28 de julho, consideradas não competitivas, nem transparentes.

“O que ocorreu nos últimos anos é muito positivo e foi realizado por um governo sob sanções, com o qual temos profundas diferenças”, declarou à BBC News Mundo Ricardo Cussano, ex-presidente da Fedecámaras (Federação Venezuelana de Câmaras de Comércio e Produção), a principal organização empresarial do país. Ele defendeu a nova postura empresarial nos seguintes termos:

“O país precisa estabelecer confiança para atrair investimentos e isso passa por fazer com que os conflitos políticos deixem de existir e se abra um processo de negociação e diálogo verdadeiro, para fazer com que as instituições venezuelanas sejam mais robustas e inclusivas.”

Esta premissa de empresários como Cussano foi fortemente criticada pela oposição política venezuelana. Eles receiam que esta aliança prejudique os esforços rumo às mudanças políticas evidenciadas nas eleições de 28 de julho, segundo as atas dos resultados publicadas pela oposição, demonstrando a vitória do candidato de oposição, Edmundo González.

Depois de duas décadas proibindo o uso do dólar, as autoridades venezuelanas deram início à “dolarização informal” da sua economia em 2018

Mais próximo da Rússia que da China

A economia venezuelana “vive uma transição que tem como referência o modelo chinês”, declarou, no fim de 2023, Rafael Lacava, governador do Estado venezuelano de Carabobo e membro da direção nacional do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), governista, para explicar as mudanças econômicas produzidas no país.

Mas os especialistas questionam se esta comparação é adequada à realidade venezuelana.

“Esta ‘abertura’ é caracterizada por uma aparente liberdade de mercado sem concorrência real, pelo predomínio de elites econômicas vinculadas ao governo e pela ausência de planejamento econômico sofisticado”, explica o cientista político Guillermo Tell Aveledo, “diferentemente dos modelos vietnamita e chinês, que possuem estruturas abrangentes e elites relativamente sérias”.

Monaldi concorda com esta análise. Ele acredita que as autoridades venezuelanas parecem estar copiando o modelo russo, não o chinês.

Para ele, “Maduro segue o modelo imposto por [Vladimir] Putin na Rússia, no qual o Estado mantém intervenção muito significativa, mas existe uma oligarquia de empresários próximos ao regime que detêm enorme influência sobre a economia”.

Reforçam esta tese a ascensão do controverso empresário colombiano-venezuelano Alex Saab ao gabinete ministerial de Maduro e as informações da organização Transparência Venezuela, que dão conta de que cerca de 48 empresas estatais já foram entregues a particulares (muitos deles, próximos de altos funcionários do governo).

O governo da Venezuela afirma que está seguindo o modelo econômico chinês, mas alguns especialistas acreditam que o modelo mais próximo é o russo

Consolidação ou retrocesso?

Começa agora um novo mandato presidencial, novamente marcado pelo conflito político.

Muitos países consideram o candidato de oposição Edmundo González como presidente legítimo, já que ele seria, segundo os resultados publicados, o vencedor das eleições de julho passado. Mas Nicolás Maduro é quem detém o poder.

Neste contexto, surge a pergunta: esse experimento é sustentável a longo prazo? Os especialistas têm opiniões discordantes a este respeito.

“Estas aberturas surgiram por pragmatismo”, afirma Antulio Rosales. “Era preciso fazê-lo para manter certa estabilidade e continuar no poder. Mas eu diria que, agora, depois de quatro ou cinco anos, elas são irreversíveis.”

Para o professor, os setores que se beneficiaram do novo modelo são uma das razões que irão assegurar sua sobrevivência.

“As bases de sustentação do poder estão, entre outros setores, nos militares, que se beneficiaram economicamente desta mudança, e no setor privado, que foi disciplinado e até se transformou em um novo aliado do regime político”, acrescenta.

Já Francisco Monaldi tem suas dúvidas e recorre à história como argumento.

“Para mim, a grande pergunta é: se as sanções forem suspensas e a produção petrolífera for recuperada, Maduro continuará sendo pragmático e liberalizador ou voltará a querer controlar tudo?”

O economista imediatamente recorda que “os cubanos liberalizaram a economia cerca de três ou quatro vezes desde a queda da União Soviética e depois retrocederam, porque eles têm muito receio dos participantes independentes da economia, que não podem controlar. [O presidente chinês] Xi Jinping faz o mesmo atualmente com os ricos”.

Por outro lado, os empresários desejam que o novo modelo se consolide. E, com eles como aliados, voluntária ou involuntariamente, Maduro também procura se manter no poder para um terceiro mandato, apesar dos conflitos políticos internos e da sua rejeição internacional.

Como Venezuela foi do ‘socialismo do século 21’ ao ‘capitalismo autoritário’ com Maduro

“Exproprie-se!”

O ex-presidente venezuelano Hugo Chávez (1954-2013) transformou esta ordem em seu grito de guerra. Em 2007, passou a usá-lo para anunciar a estatização de fábricas, bancos, hotéis, empresas de telecomunicações e energia, além de cinco milhões de hectares de terras.

As desapropriações foram um dos pilares de sustentação do novo modelo político, econômico e social promovido pelo mandatário no início dos anos 2000: o chamado socialismo do século 21.

Mas Nicolás Maduro – seu sucessor desde 2013, que se autoproclama “filho de Chávez” e defensor do seu legado – começou, sem muito alarde, a se afastar do projeto econômico do seu mentor nos últimos cinco anos.

Apesar dos questionamentos sobre sua legitimitdade, Maduro tomou posse neste 10 de janeiro. Deixou de lado os enfrentamentos com empresários que marcaram o governo Chávez e o início da sua própria gestão, optando por criar pontes com esse grupo.

“Para que serviu o conflito estéril, a guerra entre nós e não termos nos ouvido? Para o retrocesso e para causar prejuízos […] Vamos retirar a economia do antagonismo e da guerra política e nos concentrar em trabalhar para produzir”, falou o presidente venezuelano aos industriais e pecuaristas do país em julho passado.

A intenção era impedir que os conflitos políticos internos prejudicassem a economia da Venezuela.

Para isso, além das palavras, Maduro tomou medidas concretas. Nos últimos anos, devolveu centros comerciais e fazendas a seus proprietários originais e chegou a abrir a possibilidade de privatizar empresas estatais.

Em novembro, o presidente da Confederação Venezuelana das Indústrias (Conindustria), Luigi Pisella, declarou que o governo planejava transferir para o capital privado 350 empresas desapropriadas pelo Estado nas últimas duas décadas.

Todos estes gestos fazem crer que o país está consolidando um novo modelo, que alguns especialistas definiram como “capitalismo autoritário”.

Frente a protestos da oposição, Maduro iniciou o terceiro mandato em 10 de janeiro

Permanência da ‘elite governante’

Mas o que é o capitalismo autoritário e quais são suas características?

“É um sistema que permite ao capital privado enriquecer, mas, simultaneamente, os direitos sociais, econômicos e políticos dos cidadãos são enfraquecidos para favorecer a permanência das elites governantes no poder”, explica à BBC News Mundo, serviço de notícias em espanhol da BBC, o professor de ciência política Antulio Rosales, da Universidade York, no Canadá.

Em termos similares define o cientista político Guillermo Tell Aveledo, decano da Faculdade de Estudos Jurídicos e Políticos da Universidade Metropolitana de Caracas, na Venezuela.

Ele avalia, contudo, que o capitalismo autoritário venezuelano não é convencional.

“A ‘abertura’ carece de uma racionalidade econômica profunda, enquanto o sistema político permanece fechado e fortemente centralizado”, explica ele.

“Este sistema não representa uma ruptura com o socialismo do século 21, mas sim uma adaptação pragmática, que pretende perpetuar o poder sob novas condições.”

Nos últimos cinco anos, os venezuelanos observaram como, quase da noite para o dia, desapareceram os controles de preços e divisas vigentes desde 2003. O uso do dólar internamente foi descriminalizado, a economia foi dolarizada de fato, o que reduziu a inflação, e os trâmites de importação de bens foram simplificados.

Estas medidas colocaram fim à angustiante escassez de alimentos e remédios, causada tanto pelas regulamentações de preços, quanto pela má gestão das empresas estatizadas.

Proliferam hoje na Venezuela negócios criados para o consumidor de classe alta, principalmente na capital, Caracas. Estes empreendimentos não existiam no país há apenas cinco ou sete anos.

Mas, ao lado de um boom de consumo e luxo, os preços dos produtos também dispararam e milhões de pessoas mergulharam na pobreza.

O mal-estar social ante a histórica crise econômica vivida pelo país forçou as autoridades a abandonar algumas das políticas do socialismo do século 21

O pragmatismo

Os ajustes serviram para que o país saísse da sua histórica hiperinflação, iniciada em 2017, e para que sua economia atingisse 13 trimestres de crescimento consecutivos, segundo dados do Banco Central da Venezuela (BCV).

Para os especialistas consultados, esta mudança não foi produto de uma revisão ideológica, nem de retificações por parte das autoridades. Foi algo forçado pelas circunstâncias.

“A abertura se dá porque a receita do petróleo entra em colapso, devido à combinação da queda dos preços do produto nos mercados internacionais a partir de 2014 e da redução da produção nacional”, afirma o economista Francisco Monaldi, professor da Universidade Rice, nos Estados Unidos.

O petróleo é a principal fonte de divisas da Venezuela. O país extraía três milhões de barris diários no início do século, mas a produção caiu para meio milhão em 2020, queda que deixou o Estado sem mais de 90% de sua receita, segundo declarou Maduro no último mês de julho.

Queda da indústria petrolífera venezuelana é uma das principais causas das mudanças econômicas promovidas pelo governo do país, segundo os especialistas

“A falta de receita obrigou as autoridades a recorrerem àqueles que poderiam ter dinheiro e eram tradicionalmente considerados inimigos: os empresários”, explica o economista.

Rosales concorda que as mudanças econômicas foram impostas pela crise gerada pelo próprio modelo socialista, mas destaca um fator externo: as sanções impostas por diversos países ao governo de Maduro nos últimos anos por ataques à democracia e violações de direitos humanos.

“O governo teve seus caminhos bloqueados para dar prosseguimento ao socialismo baseado na receita, ou seja, vender petróleo no mercado internacional e redistribuir estes fundos internamente”, prossegue Rosales.

“Isso, somado às pressões internas [a insatisfação social e os protestos] causadas pela escassez e pela inflação, forçaram a geração de certas aberturas para manter o poder.”

A maior parte das sanções impostas nos últimos anos pelos Estados Unidos, União Europeia, Canadá e outros países foi dirigida a funcionários e ex-funcionários venezuelanos e seus familiares próximos.

Mas algumas dessas medidas tiveram como alvo a companhia estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA), o Banco Central do país e outras instâncias governamentais, que tiveram fechadas suas portas para os mercados internacionais tradicionais.

Já Monaldi acredita que as sanções internacionais foram apenas um ingrediente a mais.

“Em 2017, quando foram impostas as sanções financeiras [à PDVSA e ao BCV], a Venezuela estava a ponto de uma moratória financeira generalizada”, recorda o economista.

Monaldi defende que a razão fundamental da virada do governo foi a crise econômica “autoinfligida” que surgiu em 2017.

“A hiperinflação leva os governos a serem pragmáticos, incluindo os que são mais de esquerda”, segundo ele.

Como prova de suas argumentações, Monaldi menciona duas decisões que, segundo ele, teriam sido impossíveis de se imaginar dois anos atrás.

A primeira foi a aceitação de que a petroleira norte-americana Chevron administrasse sua empresa de capital misto com a PDVSA, o que é proibido pela legislação venezuelana. A segunda foi a concessão da empresa Ferrominera del Orinoco, a maior produtora de ferro do país, à companhia indiana Jindal.

As sanções pessoais também fizeram com que muitos empreendedores milionários investissem em negócios na Venezuela, criando a demanda doméstica por um consumo de alto valor que, até então, podia ser satisfeito no exterior.

As medidas liberais do governo de Maduro permitiram solucionar o problema da escassez de alimentos e retirar a Venezuela da hiperinflação

De inimigos a aliados

A mudança de atitude das autoridades em relação aos empresários, particularmente os tradicionais, traz consigo suas condições.

“Os empresários, principalmente os nacionais, sabem que existem regras que eles devem respeitar e uma delas é jogar com o governo”, destaca Rosales.

Isso significa que “os empresários não devem se intrometer em política – ou melhor, se forem se intrometer em política, que seja para apoiar as iniciativas do governo, não a oposição, nem outro tipo de dissidência”.

“Os empresários sabem que, se cumprirem com este ponto, abrem-se as portas às oportunidades de grandes lucros em certos mercados com enormes distorções”, prossegue o professor.

E os fatos confirmam suas palavras. Nos últimos cinco anos, também ocorreu uma mudança de atitude dos empresários em relação ao governo.

No passado recente, as principais associações empresariais haviam formado um bloco para enfrentar o chavismo nas ruas e nas urnas, em conjunto com os sindicatos, partidos políticos de oposição e outras organizações civis. Mas, agora, eles parecem ter se aproximado do governo.

“As relações institucionais entre o Executivo nacional, regional e municipal e todos os setores econômicos estão articuladas e trabalhando em conjunto para solucionar as dificuldades” econômicas enfrentadas pelo país, declarou em um comunicado a Federação de Câmaras e Empresas da Venezuela (Fedeindustria).

No documento, a organização rejeitou a possibilidade de que os Estados Unidos imponham novamente medidas contrárias ao setor petrolífero venezuelano, após as críticas ao governo de Maduro devido às eleições presidenciais de 28 de julho, consideradas não competitivas, nem transparentes.

“O que ocorreu nos últimos anos é muito positivo e foi realizado por um governo sob sanções, com o qual temos profundas diferenças”, declarou à BBC News Mundo Ricardo Cussano, ex-presidente da Fedecámaras (Federação Venezuelana de Câmaras de Comércio e Produção), a principal organização empresarial do país. Ele defendeu a nova postura empresarial nos seguintes termos:

“O país precisa estabelecer confiança para atrair investimentos e isso passa por fazer com que os conflitos políticos deixem de existir e se abra um processo de negociação e diálogo verdadeiro, para fazer com que as instituições venezuelanas sejam mais robustas e inclusivas.”

Esta premissa de empresários como Cussano foi fortemente criticada pela oposição política venezuelana. Eles receiam que esta aliança prejudique os esforços rumo às mudanças políticas evidenciadas nas eleições de 28 de julho, segundo as atas dos resultados publicadas pela oposição, demonstrando a vitória do candidato de oposição, Edmundo González.

Depois de duas décadas proibindo o uso do dólar, as autoridades venezuelanas deram início à “dolarização informal” da sua economia em 2018

Mais próximo da Rússia que da China

A economia venezuelana “vive uma transição que tem como referência o modelo chinês”, declarou, no fim de 2023, Rafael Lacava, governador do Estado venezuelano de Carabobo e membro da direção nacional do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), governista, para explicar as mudanças econômicas produzidas no país.

Mas os especialistas questionam se esta comparação é adequada à realidade venezuelana.

“Esta ‘abertura’ é caracterizada por uma aparente liberdade de mercado sem concorrência real, pelo predomínio de elites econômicas vinculadas ao governo e pela ausência de planejamento econômico sofisticado”, explica o cientista político Guillermo Tell Aveledo, “diferentemente dos modelos vietnamita e chinês, que possuem estruturas abrangentes e elites relativamente sérias”.

Monaldi concorda com esta análise. Ele acredita que as autoridades venezuelanas parecem estar copiando o modelo russo, não o chinês.

Para ele, “Maduro segue o modelo imposto por [Vladimir] Putin na Rússia, no qual o Estado mantém intervenção muito significativa, mas existe uma oligarquia de empresários próximos ao regime que detêm enorme influência sobre a economia”.

Reforçam esta tese a ascensão do controverso empresário colombiano-venezuelano Alex Saab ao gabinete ministerial de Maduro e as informações da organização Transparência Venezuela, que dão conta de que cerca de 48 empresas estatais já foram entregues a particulares (muitos deles, próximos de altos funcionários do governo).

O governo da Venezuela afirma que está seguindo o modelo econômico chinês, mas alguns especialistas acreditam que o modelo mais próximo é o russo

Consolidação ou retrocesso?

Começa agora um novo mandato presidencial, novamente marcado pelo conflito político.

Muitos países consideram o candidato de oposição Edmundo González como presidente legítimo, já que ele seria, segundo os resultados publicados, o vencedor das eleições de julho passado. Mas Nicolás Maduro é quem detém o poder.

Neste contexto, surge a pergunta: esse experimento é sustentável a longo prazo? Os especialistas têm opiniões discordantes a este respeito.

“Estas aberturas surgiram por pragmatismo”, afirma Antulio Rosales. “Era preciso fazê-lo para manter certa estabilidade e continuar no poder. Mas eu diria que, agora, depois de quatro ou cinco anos, elas são irreversíveis.”

Para o professor, os setores que se beneficiaram do novo modelo são uma das razões que irão assegurar sua sobrevivência.

“As bases de sustentação do poder estão, entre outros setores, nos militares, que se beneficiaram economicamente desta mudança, e no setor privado, que foi disciplinado e até se transformou em um novo aliado do regime político”, acrescenta.

Já Francisco Monaldi tem suas dúvidas e recorre à história como argumento.

“Para mim, a grande pergunta é: se as sanções forem suspensas e a produção petrolífera for recuperada, Maduro continuará sendo pragmático e liberalizador ou voltará a querer controlar tudo?”

O economista imediatamente recorda que “os cubanos liberalizaram a economia cerca de três ou quatro vezes desde a queda da União Soviética e depois retrocederam, porque eles têm muito receio dos participantes independentes da economia, que não podem controlar. [O presidente chinês] Xi Jinping faz o mesmo atualmente com os ricos”.

Por outro lado, os empresários desejam que o novo modelo se consolide. E, com eles como aliados, voluntária ou involuntariamente, Maduro também procura se manter no poder para um terceiro mandato, apesar dos conflitos políticos internos e da sua rejeição internacional.

Como debate sobre imigração cresceu no Canadá e selou destino de Trudeau

O tema da imigração tem polarizado debates e mobilizado eleitores já há algum tempo em diversos países ricos do Ocidente.

O Canadá até recentemente havia conseguido se esquivar dessa onda, mas agora a questão não só ganhou protagonismo como foi apontada como uma das razões que levaram à erosão da popularidade do primeiro-ministro Justin Trudeau e à sua renúncia no último dia 6 de janeiro.

O percentual de canadenses que dizia acreditar que o país estava recebendo imigrantes demais dobrou entre 2022 e 2024, de 27% para 58%, de acordo com uma pesquisa da empresa Environics.

Nos últimos anos, grupos de ativistas se organizaram pelo país e realizaram protestos contra a imigração em locais como Ottawa, Vancouver e Calgary.

“Eu diria que era muito tabu, como se ninguém realmente falasse sobre isso”, diz Peter Kratzar, engenheiro de software e fundador do Cost of Living Canada, grupo ativista formado em 2024. “[Mas] as coisas realmente desbloquearam.”

Um dos fatores que alimentaram esse novo momento foi o aumento expressivo do custo de vida nos últimos anos, com escassez de moradias e salto no valor dos aluguéis.

Cerca de 2,4 milhões de famílias canadenses estão amontoadas em casas minúsculas, com necessidade urgente de grandes reparos ou que lhes são financeiramente inacessíveis, conforme um relatório de fiscalização do governo divulgado em dezembro.

Esse cenário se desenrola ao mesmo tempo em que a inflação atinge duramente e de forma disseminada o bolso dos canadenses, fazendo com que alguns passassem a questionar se o país tem capacidade para continuar recebendo imigrantes.

Cama no banheiro

À primeira vista, o quarto individual para alugar em Brampton, Ontário, parece uma pechincha.

É verdade que a área útil é mínima, mas o valor pedido é de apenas C$ 550 ( R$ 2.332) por mês em um subúrbio de Toronto, onde o aluguel médio mensal de um apartamento de um quarto é de C$ 2.261 (R$ 9.588).

Quem olhar com mais atenção, no entanto, vai percebe que o local anunciado é, na verdade, um pequeno banheiro convertido em dormitório. Há um colchão preso ao lado da pia, próximo ao vaso sanitário.

O anúncio, postado originalmente no Facebook Marketplace, gerou centenas de comentários online. “Nojento”, escreveu um usuário do Reddit.

“Ei, pessoas de 20 e poucos anos, vocês estão olhando para o seu futuro”, diz outro.

Mas há outros anúncios como esse – outro quarto para alugar em Brampton mostra uma cama esmagada perto de uma escada no que parece ser uma área de lavanderia.

Outro imóvel para aluguel em Scarborough, um distrito em Ontário, oferece uma cama de casal no canto de uma cozinha.

Embora o Canadá possa ter muito espaço disponível, devido à sua ampla extensão, não há imóveis suficientes para atender à demanda. Nos últimos três anos, os aluguéis cresceram em média quase 20%, de acordo com a consultoria imobiliária Urbanation.

Pela primeira vez, mais da metade dos canadenses acredita que a imigração é muito alta

Histórias como a do quarto-banheiro em Brampton alimentaram a discussão sobre imigração, afirma Kratzar, do grupo Cost of Living Canada: “As pessoas podem dizer, tipo, isso é tudo evidência anedótica. Mas a evidência continua aparecendo. Você vê isso repetidamente.”

“As pessoas começaram a ficar preocupadas com a forma como o sistema de imigração vinha sendo administrado”, acrescenta Keith Neuman, diretor executivo da Environics.

“Acreditamos que é a primeira vez que as pessoas realmente pensam sobre a gestão do sistema.”

Justin Trudeau renunciou em 6 de janeiro em meio a esse descontentamento crescente em relação à imigração. O premiê foi acusado de agir tarde demais ao lidar com a crescente ansiedade sobre inflação e moradia que muitos atribuíram, em parte, à imigração.

A taxa de aprovação de seu governo antes do anúncio havia chegado a apenas 22% – muito longe do primeiro ano de seu mandato, quando 65% dos eleitores disseram aprovar sua gestão.

“Embora a imigração talvez não tenha sido a causa imediata da renúncia, pode ter sido a cereja do bolo”, diz o professor Jonathan Rose, chefe do departamento de estudos políticos da Queen’s University em Kingston, Ontário.

Na saída da pandemia, a administração de Trudeau optou deliberadamente por incentivar a entrada de imigrantes no país, apostando que aumentar as cotas para estudantes estrangeiros e trabalhadores temporários, além de imigrantes qualificados, daria um impulso à economia.

A população, que era de 35 milhões há 10 anos, agora ultrapassa 40 milhões.

A imigração foi responsável pela maior parte desse aumento – dados da agência nacional de estatísticas do Canadá mostram que, em 2024, mais de 90% do crescimento populacional veio da imigração.

Além do aumento geral nos níveis de migração, o número de refugiados também cresceu. Em 2013, havia 10.365 solicitações de refúgio no Canadá; em 2023, esse número saltou para 143.770.

A insatisfação dos eleitores com a imigração foi “mais um sintoma do que uma causa” da queda de Trudeau, argumenta a professora Rose. “Ela reflete sua aparente incapacidade de captar o clima da opinião pública.”

Ainda não está claro quem pode substituir Trudeau dentro do Partido Liberal, mas, com as eleições se aproximando, as pesquisas atualmente favorecem o Partido Conservador. Seu líder, Pierre Poilievre, defende que o número de novos imigrantes seja limitado ao total de novas habitações em construção.

Desde que Donald Trump venceu as eleições presidenciais nos EUA, em novembro, Poilievre “tem falado muito mais sobre imigração”, afirma a professora Rose – “tanto que o tema se tornou uma prioridade na mente dos eleitores”.

Donald Trump e Justin Trudeau na cúpula da OTAN no Grove Hotel, em Watford, Inglaterra, em 4 de dezembro de 2019

Certamente, a chegada de Trump para um segundo mandato está prestes a intensificar ainda mais uma questão já delicada no Canadá, independentemente de quem seja o novo primeiro-ministro.

Trump venceu as eleições nos EUA, em parte, com a promessa de realizar deportações em massa de migrantes sem documentação.

Desde sua vitória, ele declarou que pretende mobilizar as forças armadas e decretar emergência nacional para cumprir essa promessa.

Ele também anunciou planos de impor tarifas de 25% sobre produtos canadenses, caso a segurança na fronteira não seja reforçada.

Drones, câmeras e policiamento na fronteira

O Canadá e os Estados Unidos compartilham a maior fronteira não defendida do mundo. Com quase 9 mil km, grande parte dela atravessa áreas de floresta densa e é marcada pelo que é conhecido como The Slash, uma faixa de terra desmatada com seis metros de largura.

Diferentemente da fronteira sul dos EUA, não há muros. Isso sempre foi motivo de orgulho para Ottawa e Washington, simbolizando os laços estreitos entre os dois países.

Após Trump assumir a presidência pela primeira vez, em 2017, o número de pedidos de asilo disparou, com milhares de pessoas cruzando a fronteira a pé para o Canadá.

Segundo o governo canadense, o número de pedidos saltou de pouco menos de 24 mil em 2016 para 55 mil por ano até 2018. Quase todos atravessaram do estado de Nova York para a província canadense de Quebec.

Passagem da fronteira internacional entre o Canadá e os Estados Unidos em Saint-Bernard-de-Lacolle, Quebec, Canadá, 20 de novembro de 2024

Em 2023, Canadá e Estados Unidos firmaram um acordo mais rígido sobre a fronteira, que impediu a maioria dos migrantes de cruzar por terra de um país para o outro. Pelo acordo, migrantes que entrarem em contato com as autoridades dentro de 14 dias após atravessarem qualquer parte da fronteira devem retornar ao país onde entraram primeiro para solicitar asilo lá.

O acordo, revisado por Trudeau e Joe Biden, baseia-se na premissa de que tanto os EUA quanto o Canadá são países seguros para solicitantes de asilo.

Desta vez, a polícia nacional do Canadá – a Real Polícia Montada do Canadá (RCMP) – afirmou ter iniciado a preparação de um plano de contingência para o aumento de cruzamentos de migrantes na fronteira muito antes de Trump assumir o cargo.

Esse plano inclui uma série de novas tecnologias, como drones, óculos de visão noturna e câmeras de vigilância escondidas na floresta.

Joe Biden e Justin Trudeau, durante a 50ª cúpula do G7 em Borgo Egnazia, em 13 de junho de 2024 em Fasano, Itália

“O pior cenário seria pessoas cruzando em grande número por todo o território”, alertou o porta-voz da RCMP, Charles Poirier, em novembro. “Se tivermos 100 pessoas entrando por dia pela fronteira, será muito difícil, porque nossos oficiais terão que cobrir distâncias enormes para deter todos.”

Agora, o governo nacional destinou mais C$ 1,3 bilhão (R$ 5,512 bilhões) para reforçar seu plano de segurança na fronteira.

Nem todos atribuem a crise habitacional ao recente aumento na imigração. Segundo a prefeita de Toronto, Olivia Chow, o problema “vem sendo construído ao longo de 30 anos” devido à incapacidade dos políticos de criar moradias acessíveis.

Sem dúvida, o país tem uma longa tradição de acolher novos moradores. “Quase 50% da população do Canadá é de primeira ou segunda geração”, explica Neuman.

“Isso significa que essas pessoas vieram de outro país ou que um ou ambos os pais delas vieram de outro país. Em cidades como Toronto e Vancouver, esse número supera 80%.”

Isso torna o Canadá “um lugar muito diferente de um país com uma população homogênea”, ele argumenta.

Neuman está envolvido há 40 anos em pesquisas sobre as atitudes dos canadenses em relação aos recém-chegados.

“Se você perguntar aos canadenses qual é a característica mais importante ou distintiva do Canadá, ou o que torna o país único, a resposta mais comum é ‘multiculturalismo’ ou ‘diversidade'”, ele destaca.

Ainda assim, ele reconhece que houve uma mudança significativa na opinião pública – e um aumento nas preocupações relacionadas à imigração.

“Agora, não apenas há uma preocupação mais ampla, mas também discussões muito mais abertas”, ele observa. “Mais perguntas estão sendo feitas, como: o sistema está funcionando? Por que ele não está funcionando?”

A prefeita de Toronto, Olivia Chow, rejeita a sugestão de que o sentimento anti-imigração se espalhará no Canadá

Em um dos protestos em Toronto, uma multidão reuniu-se com cartazes pintados à mão, alguns com os dizeres: “Queremos nosso futuro de volta!” e “Fim da imigração em massa”.

“Precisamos implementar uma moratória na imigração”, argumenta o Sr. Kratzar, cujo grupo participou de alguns desses protestos. “É necessário pausar isso para que os salários possam acompanhar o custo dos aluguéis.”

Acusações contra os recém-chegados também estão se espalhando nas redes sociais. No verão passado, Natasha White, que se descreve como residente de Wasaga Beach, em Ontário, afirmou no TikTok que alguns recém-chegados estavam cavando buracos na praia e defecando neles.

A publicação gerou centenas de milhares de visualizações e uma onda de ódio contra estrangeiros, com muitos comentando que os recém-chegados deveriam “voltar para casa”.

Cidades de barracas e abrigos lotados

Pessoas que entrevistei e que trabalham diretamente com solicitantes de asilo no Canadá afirmam que as crescentes preocupações em relação à necessidade de mais segurança na fronteira estão deixando esses migrantes inquietos e temerosos.

Abdulla Daoud, diretor-executivo do Refugee Center (centro de refugiados, em tradução para o português), em Montreal, acredita que os solicitantes de asilo vulneráveis com quem trabalha sentem-se marcados pelo foco no número de migrantes desde a eleição nos Estados Unidos

. “Eles estão, sem dúvida, mais ansiosos”, ele diz. “Acho que chegam aqui se perguntando: ‘Serei bem-recebido? Estou no lugar certo ou não?'”

Aqueles que esperam permanecer no Canadá como refugiados não têm acesso aos serviços oficiais de integração até que se decida que realmente precisam de asilo. Esse processo, que costumava levar duas semanas, agora pode demorar até três anos.

A ‘Royal Canadian Mounted Police’ começou a preparar um plano de contingência para o aumento das travessias de migrantes na fronteira no final de 2024

Cidades de tendas para abrigar refugiados recém-chegados e bancos de alimentos com prateleiras vazias surgiram em Toronto. Os abrigos para moradores de rua da cidade frequentemente estão lotados. No inverno passado, dois solicitantes de refúgio morreram congelados após dormirem nas ruas de Toronto.

A prefeita de Toronto, Olivia Chow, uma imigrante que se mudou de Hong Kong para o Canadá aos 13 anos, afirma: “As pessoas estão vendo que, mesmo trabalhando em dois ou três empregos, não conseguem dinheiro suficiente para pagar o aluguel e alimentar os filhos.

“Eu entendo a dificuldade de viver em um lugar onde a vida não é acessível e o medo de ser despejado, absolutamente, eu entendo. Mas culpar isso no sistema de imigração é injusto.”

Trudeau acrescentou: “Não encontramos o equilíbrio certo”

Com as frustrações crescendo, Trudeau anunciou uma grande mudança em outubro: uma redução de 20% nas metas de imigração ao longo de três anos.

“Ao sairmos da pandemia, entre atender às necessidades de mão de obra e manter o crescimento populacional, não encontramos o equilíbrio certo”, admitiu.

Ele acrescentou que queria dar tempo para que todos os níveis de governo se ajustassem – para acomodar mais pessoas.

Mas, considerando que ele renunciou desde então, será isso suficiente? E o governo Trump e o crescente sentimento anti-imigrante do lado de lá da fronteira correm o risco de se espalhar mais para o Canadá?

O Sr. Daoud tem sua própria opinião. “Infelizmente, acho que a presidência de Trump teve impacto na política canadense”, diz ele. “Acho que muitos políticos estão usando isso como uma maneira de semear o medo.”

Outros estão menos convencidos de que terá grande impacto. “Os canadenses são melhores do que isso”, diz Olivia Chow. “Lembramos que ondas sucessivas de refugiados ajudaram a criar Toronto e o Canadá.”

Políticos envolvidos no debate sobre o crescimento populacional antes da próxima eleição estarão conscientes de que metade dos canadenses são imigrantes de primeira e segunda geração. “Se os conservadores vencerem a próxima eleição, podemos esperar uma redução na imigração”, diz o professor Jonathan Rose. Mas ele acrescenta que Poilievre terá que caminhar “uma linha fina”.

O professor Rose afirma: “Como as circunscrições com grande número de imigrantes em Toronto e Vancouver serão importantes para qualquer vitória eleitoral, ele não pode ser visto como anti-imigração, mas sim como alguém que está apenas recalibrando a imigração para adequá-la à política econômica e habitacional.”

E há um grande número de canadenses, incluindo líderes empresariais e acadêmicos, que acreditam que o país deve continuar a perseguir uma política de crescimento assertiva para combater a queda da taxa de natalidade no Canadá.

“Tenho grandes esperanças nos canadenses”, acrescenta Lisa Lalande, da Century Initiative, que defende políticas para aumentar a população do Canadá para 100 milhões até 2100. “Na verdade, acredito que vamos superar onde estamos agora.

“Acho que estamos realmente preocupados com a acessibilidade [e] o custo de vida – não com os imigrantes em si. Reconhecemos que eles são muito importantes para a nossa cultura.”

Como debate sobre imigração cresceu no Canadá e selou destino de Trudeau

O tema da imigração tem polarizado debates e mobilizado eleitores já há algum tempo em diversos países ricos do Ocidente.

O Canadá até recentemente havia conseguido se esquivar dessa onda, mas agora a questão não só ganhou protagonismo como foi apontada como uma das razões que levaram à erosão da popularidade do primeiro-ministro Justin Trudeau e à sua renúncia no último dia 6 de janeiro.

O percentual de canadenses que dizia acreditar que o país estava recebendo imigrantes demais dobrou entre 2022 e 2024, de 27% para 58%, de acordo com uma pesquisa da empresa Environics.

Nos últimos anos, grupos de ativistas se organizaram pelo país e realizaram protestos contra a imigração em locais como Ottawa, Vancouver e Calgary.

“Eu diria que era muito tabu, como se ninguém realmente falasse sobre isso”, diz Peter Kratzar, engenheiro de software e fundador do Cost of Living Canada, grupo ativista formado em 2024. “[Mas] as coisas realmente desbloquearam.”

Um dos fatores que alimentaram esse novo momento foi o aumento expressivo do custo de vida nos últimos anos, com escassez de moradias e salto no valor dos aluguéis.

Cerca de 2,4 milhões de famílias canadenses estão amontoadas em casas minúsculas, com necessidade urgente de grandes reparos ou que lhes são financeiramente inacessíveis, conforme um relatório de fiscalização do governo divulgado em dezembro.

Esse cenário se desenrola ao mesmo tempo em que a inflação atinge duramente e de forma disseminada o bolso dos canadenses, fazendo com que alguns passassem a questionar se o país tem capacidade para continuar recebendo imigrantes.

Cama no banheiro

À primeira vista, o quarto individual para alugar em Brampton, Ontário, parece uma pechincha.

É verdade que a área útil é mínima, mas o valor pedido é de apenas C$ 550 ( R$ 2.332) por mês em um subúrbio de Toronto, onde o aluguel médio mensal de um apartamento de um quarto é de C$ 2.261 (R$ 9.588).

Quem olhar com mais atenção, no entanto, vai percebe que o local anunciado é, na verdade, um pequeno banheiro convertido em dormitório. Há um colchão preso ao lado da pia, próximo ao vaso sanitário.

O anúncio, postado originalmente no Facebook Marketplace, gerou centenas de comentários online. “Nojento”, escreveu um usuário do Reddit.

“Ei, pessoas de 20 e poucos anos, vocês estão olhando para o seu futuro”, diz outro.

Mas há outros anúncios como esse – outro quarto para alugar em Brampton mostra uma cama esmagada perto de uma escada no que parece ser uma área de lavanderia.

Outro imóvel para aluguel em Scarborough, um distrito em Ontário, oferece uma cama de casal no canto de uma cozinha.

Embora o Canadá possa ter muito espaço disponível, devido à sua ampla extensão, não há imóveis suficientes para atender à demanda. Nos últimos três anos, os aluguéis cresceram em média quase 20%, de acordo com a consultoria imobiliária Urbanation.

Pela primeira vez, mais da metade dos canadenses acredita que a imigração é muito alta

Histórias como a do quarto-banheiro em Brampton alimentaram a discussão sobre imigração, afirma Kratzar, do grupo Cost of Living Canada: “As pessoas podem dizer, tipo, isso é tudo evidência anedótica. Mas a evidência continua aparecendo. Você vê isso repetidamente.”

“As pessoas começaram a ficar preocupadas com a forma como o sistema de imigração vinha sendo administrado”, acrescenta Keith Neuman, diretor executivo da Environics.

“Acreditamos que é a primeira vez que as pessoas realmente pensam sobre a gestão do sistema.”

Justin Trudeau renunciou em 6 de janeiro em meio a esse descontentamento crescente em relação à imigração. O premiê foi acusado de agir tarde demais ao lidar com a crescente ansiedade sobre inflação e moradia que muitos atribuíram, em parte, à imigração.

A taxa de aprovação de seu governo antes do anúncio havia chegado a apenas 22% – muito longe do primeiro ano de seu mandato, quando 65% dos eleitores disseram aprovar sua gestão.

“Embora a imigração talvez não tenha sido a causa imediata da renúncia, pode ter sido a cereja do bolo”, diz o professor Jonathan Rose, chefe do departamento de estudos políticos da Queen’s University em Kingston, Ontário.

Na saída da pandemia, a administração de Trudeau optou deliberadamente por incentivar a entrada de imigrantes no país, apostando que aumentar as cotas para estudantes estrangeiros e trabalhadores temporários, além de imigrantes qualificados, daria um impulso à economia.

A população, que era de 35 milhões há 10 anos, agora ultrapassa 40 milhões.

A imigração foi responsável pela maior parte desse aumento – dados da agência nacional de estatísticas do Canadá mostram que, em 2024, mais de 90% do crescimento populacional veio da imigração.

Além do aumento geral nos níveis de migração, o número de refugiados também cresceu. Em 2013, havia 10.365 solicitações de refúgio no Canadá; em 2023, esse número saltou para 143.770.

A insatisfação dos eleitores com a imigração foi “mais um sintoma do que uma causa” da queda de Trudeau, argumenta a professora Rose. “Ela reflete sua aparente incapacidade de captar o clima da opinião pública.”

Ainda não está claro quem pode substituir Trudeau dentro do Partido Liberal, mas, com as eleições se aproximando, as pesquisas atualmente favorecem o Partido Conservador. Seu líder, Pierre Poilievre, defende que o número de novos imigrantes seja limitado ao total de novas habitações em construção.

Desde que Donald Trump venceu as eleições presidenciais nos EUA, em novembro, Poilievre “tem falado muito mais sobre imigração”, afirma a professora Rose – “tanto que o tema se tornou uma prioridade na mente dos eleitores”.

Donald Trump e Justin Trudeau na cúpula da OTAN no Grove Hotel, em Watford, Inglaterra, em 4 de dezembro de 2019

Certamente, a chegada de Trump para um segundo mandato está prestes a intensificar ainda mais uma questão já delicada no Canadá, independentemente de quem seja o novo primeiro-ministro.

Trump venceu as eleições nos EUA, em parte, com a promessa de realizar deportações em massa de migrantes sem documentação.

Desde sua vitória, ele declarou que pretende mobilizar as forças armadas e decretar emergência nacional para cumprir essa promessa.

Ele também anunciou planos de impor tarifas de 25% sobre produtos canadenses, caso a segurança na fronteira não seja reforçada.

Drones, câmeras e policiamento na fronteira

O Canadá e os Estados Unidos compartilham a maior fronteira não defendida do mundo. Com quase 9 mil km, grande parte dela atravessa áreas de floresta densa e é marcada pelo que é conhecido como The Slash, uma faixa de terra desmatada com seis metros de largura.

Diferentemente da fronteira sul dos EUA, não há muros. Isso sempre foi motivo de orgulho para Ottawa e Washington, simbolizando os laços estreitos entre os dois países.

Após Trump assumir a presidência pela primeira vez, em 2017, o número de pedidos de asilo disparou, com milhares de pessoas cruzando a fronteira a pé para o Canadá.

Segundo o governo canadense, o número de pedidos saltou de pouco menos de 24 mil em 2016 para 55 mil por ano até 2018. Quase todos atravessaram do estado de Nova York para a província canadense de Quebec.

Passagem da fronteira internacional entre o Canadá e os Estados Unidos em Saint-Bernard-de-Lacolle, Quebec, Canadá, 20 de novembro de 2024

Em 2023, Canadá e Estados Unidos firmaram um acordo mais rígido sobre a fronteira, que impediu a maioria dos migrantes de cruzar por terra de um país para o outro. Pelo acordo, migrantes que entrarem em contato com as autoridades dentro de 14 dias após atravessarem qualquer parte da fronteira devem retornar ao país onde entraram primeiro para solicitar asilo lá.

O acordo, revisado por Trudeau e Joe Biden, baseia-se na premissa de que tanto os EUA quanto o Canadá são países seguros para solicitantes de asilo.

Desta vez, a polícia nacional do Canadá – a Real Polícia Montada do Canadá (RCMP) – afirmou ter iniciado a preparação de um plano de contingência para o aumento de cruzamentos de migrantes na fronteira muito antes de Trump assumir o cargo.

Esse plano inclui uma série de novas tecnologias, como drones, óculos de visão noturna e câmeras de vigilância escondidas na floresta.

Joe Biden e Justin Trudeau, durante a 50ª cúpula do G7 em Borgo Egnazia, em 13 de junho de 2024 em Fasano, Itália

“O pior cenário seria pessoas cruzando em grande número por todo o território”, alertou o porta-voz da RCMP, Charles Poirier, em novembro. “Se tivermos 100 pessoas entrando por dia pela fronteira, será muito difícil, porque nossos oficiais terão que cobrir distâncias enormes para deter todos.”

Agora, o governo nacional destinou mais C$ 1,3 bilhão (R$ 5,512 bilhões) para reforçar seu plano de segurança na fronteira.

Nem todos atribuem a crise habitacional ao recente aumento na imigração. Segundo a prefeita de Toronto, Olivia Chow, o problema “vem sendo construído ao longo de 30 anos” devido à incapacidade dos políticos de criar moradias acessíveis.

Sem dúvida, o país tem uma longa tradição de acolher novos moradores. “Quase 50% da população do Canadá é de primeira ou segunda geração”, explica Neuman.

“Isso significa que essas pessoas vieram de outro país ou que um ou ambos os pais delas vieram de outro país. Em cidades como Toronto e Vancouver, esse número supera 80%.”

Isso torna o Canadá “um lugar muito diferente de um país com uma população homogênea”, ele argumenta.

Neuman está envolvido há 40 anos em pesquisas sobre as atitudes dos canadenses em relação aos recém-chegados.

“Se você perguntar aos canadenses qual é a característica mais importante ou distintiva do Canadá, ou o que torna o país único, a resposta mais comum é ‘multiculturalismo’ ou ‘diversidade'”, ele destaca.

Ainda assim, ele reconhece que houve uma mudança significativa na opinião pública – e um aumento nas preocupações relacionadas à imigração.

“Agora, não apenas há uma preocupação mais ampla, mas também discussões muito mais abertas”, ele observa. “Mais perguntas estão sendo feitas, como: o sistema está funcionando? Por que ele não está funcionando?”

A prefeita de Toronto, Olivia Chow, rejeita a sugestão de que o sentimento anti-imigração se espalhará no Canadá

Em um dos protestos em Toronto, uma multidão reuniu-se com cartazes pintados à mão, alguns com os dizeres: “Queremos nosso futuro de volta!” e “Fim da imigração em massa”.

“Precisamos implementar uma moratória na imigração”, argumenta o Sr. Kratzar, cujo grupo participou de alguns desses protestos. “É necessário pausar isso para que os salários possam acompanhar o custo dos aluguéis.”

Acusações contra os recém-chegados também estão se espalhando nas redes sociais. No verão passado, Natasha White, que se descreve como residente de Wasaga Beach, em Ontário, afirmou no TikTok que alguns recém-chegados estavam cavando buracos na praia e defecando neles.

A publicação gerou centenas de milhares de visualizações e uma onda de ódio contra estrangeiros, com muitos comentando que os recém-chegados deveriam “voltar para casa”.

Cidades de barracas e abrigos lotados

Pessoas que entrevistei e que trabalham diretamente com solicitantes de asilo no Canadá afirmam que as crescentes preocupações em relação à necessidade de mais segurança na fronteira estão deixando esses migrantes inquietos e temerosos.

Abdulla Daoud, diretor-executivo do Refugee Center (centro de refugiados, em tradução para o português), em Montreal, acredita que os solicitantes de asilo vulneráveis com quem trabalha sentem-se marcados pelo foco no número de migrantes desde a eleição nos Estados Unidos

. “Eles estão, sem dúvida, mais ansiosos”, ele diz. “Acho que chegam aqui se perguntando: ‘Serei bem-recebido? Estou no lugar certo ou não?'”

Aqueles que esperam permanecer no Canadá como refugiados não têm acesso aos serviços oficiais de integração até que se decida que realmente precisam de asilo. Esse processo, que costumava levar duas semanas, agora pode demorar até três anos.

A ‘Royal Canadian Mounted Police’ começou a preparar um plano de contingência para o aumento das travessias de migrantes na fronteira no final de 2024

Cidades de tendas para abrigar refugiados recém-chegados e bancos de alimentos com prateleiras vazias surgiram em Toronto. Os abrigos para moradores de rua da cidade frequentemente estão lotados. No inverno passado, dois solicitantes de refúgio morreram congelados após dormirem nas ruas de Toronto.

A prefeita de Toronto, Olivia Chow, uma imigrante que se mudou de Hong Kong para o Canadá aos 13 anos, afirma: “As pessoas estão vendo que, mesmo trabalhando em dois ou três empregos, não conseguem dinheiro suficiente para pagar o aluguel e alimentar os filhos.

“Eu entendo a dificuldade de viver em um lugar onde a vida não é acessível e o medo de ser despejado, absolutamente, eu entendo. Mas culpar isso no sistema de imigração é injusto.”

Trudeau acrescentou: “Não encontramos o equilíbrio certo”

Com as frustrações crescendo, Trudeau anunciou uma grande mudança em outubro: uma redução de 20% nas metas de imigração ao longo de três anos.

“Ao sairmos da pandemia, entre atender às necessidades de mão de obra e manter o crescimento populacional, não encontramos o equilíbrio certo”, admitiu.

Ele acrescentou que queria dar tempo para que todos os níveis de governo se ajustassem – para acomodar mais pessoas.

Mas, considerando que ele renunciou desde então, será isso suficiente? E o governo Trump e o crescente sentimento anti-imigrante do lado de lá da fronteira correm o risco de se espalhar mais para o Canadá?

O Sr. Daoud tem sua própria opinião. “Infelizmente, acho que a presidência de Trump teve impacto na política canadense”, diz ele. “Acho que muitos políticos estão usando isso como uma maneira de semear o medo.”

Outros estão menos convencidos de que terá grande impacto. “Os canadenses são melhores do que isso”, diz Olivia Chow. “Lembramos que ondas sucessivas de refugiados ajudaram a criar Toronto e o Canadá.”

Políticos envolvidos no debate sobre o crescimento populacional antes da próxima eleição estarão conscientes de que metade dos canadenses são imigrantes de primeira e segunda geração. “Se os conservadores vencerem a próxima eleição, podemos esperar uma redução na imigração”, diz o professor Jonathan Rose. Mas ele acrescenta que Poilievre terá que caminhar “uma linha fina”.

O professor Rose afirma: “Como as circunscrições com grande número de imigrantes em Toronto e Vancouver serão importantes para qualquer vitória eleitoral, ele não pode ser visto como anti-imigração, mas sim como alguém que está apenas recalibrando a imigração para adequá-la à política econômica e habitacional.”

E há um grande número de canadenses, incluindo líderes empresariais e acadêmicos, que acreditam que o país deve continuar a perseguir uma política de crescimento assertiva para combater a queda da taxa de natalidade no Canadá.

“Tenho grandes esperanças nos canadenses”, acrescenta Lisa Lalande, da Century Initiative, que defende políticas para aumentar a população do Canadá para 100 milhões até 2100. “Na verdade, acredito que vamos superar onde estamos agora.

“Acho que estamos realmente preocupados com a acessibilidade [e] o custo de vida – não com os imigrantes em si. Reconhecemos que eles são muito importantes para a nossa cultura.”

Haddad diz esperar que Brasil chegue em 2026 “comendo filé mignon”

O ministro da Fazenda Fernando Haddad disse, nesta terça-feira (dia 7), acreditar que o Brasil chegue em 2026 “comendo filé mignon”. Para isso, ele diz que o país vai precisar aproveitar suas “ vantagens competitivas”.

Em aceno a Trump: Meta anuncia que encerrará seu programa de ‘fact checking’ nos Estados Unidos Renegocia! Termina em 10 dias prazo para quitar débitos com descontos de mais de 90% por meio de programa do governo

Questionado se o governo vai encerrar esta gestão com picanha no prato do brasileiro, como prometido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Haddad disse que os programas propostos pelo governo vão fazer com que o Brasil chegue em uma boa situação no ano que vem.

— Se souber se beneficiar das vantagens competitivas que tem, nós temos a lei de inteligência artificial que passou pelo Senado, crédito de carbono que está sancionado, biocombustíveis, combustível do futuro, nova indústria do Brasil, programas bem estruturados para alavancar o desenvolvimento, eu acredito que nós podemos chegar bem em 2026, espero que até comendo filé mignon — afirmou em entrevista à Globo News nesta terça.

Na entrevista, Haddad destacou que o mundo passa por um cenário econômico de incertezas diante das promessas de políticas protecionistas pelo presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump.

No entanto, para o ministro, o Brasil está “bem posicionado” para enfrentar desafios econômicos.

— Apesar do cenário externo ainda estar um pouco nebuloso, sobretudo em relação à política econômica que será aplicada pelo próximo governo, eu acredito que o Brasil nesse contexto está bem posicionado — disse.

Segundo o ministro, é importante que o governo desenhe medidas para cortar benefícios de grupos econômicos mais favorecidos. Ele ainda frisou a importância de uma política fiscal adequada para um crescimento sustentável do país.

— Sem vender estatal na bacia das almas para favorecer grupos econômicos, sem deixar de enfrentar o jabutis de grupos empresariais campeões nacionais que, vira e mexe, conseguem benefícios ali no Congresso, é isso que nós estamos fazendo. E também contendo gastos da maneira adequada, sem prejudicar o trabalhador de baixa renda, garantindo os direitos consignados na Constituição.

Saiba Mais:

Ximbinha posa agarradinho com a mulher em praia no Pará

Desfazer

Mulher é assassinada a facadas por ex-companheiro, morto por disparos do irmão da vítima

Desfazer

Vídeos mostram primeiros momentos de terremoto que matou ao menos 95 no Tibete

Desfazer

Mais recente Próxima

Mesmo com aumento real do salário mínimo, poder de compra do brasileiro seguirá estagnado até 2026, mostra estudo

O salário mínimo no Brasil passou a ser de R$ 1.518,00 em 2025, valor R$ 106 maior do que o de 2024, e correspondente a um reajuste de 7,5%.

Mas, com o dólar nas alturas e a perspectiva de continuidade da alta do preço dos alimentos este ano, não deve haver aumento do poder de compra do brasileiro em relação ao preço da cesta básica, aponta estudo da consultoria LCA 4intelligence.

E o cenário não muda em 2026, quando o poder de compra dos brasileiros seguirá estagnado e abaixo do nível pré-pandemia.

Isso ajuda a explicar o mau humor dos brasileiros com a economia, mesmo num cenário de desemprego na mínima histórica e renda em alta, dizem analistas.

Na terça-feira passada (31/12), uma pesquisa Datafolha mostrou que 61% dos brasileiros acreditam que a economia do país está no caminho errado, ante 32% que consideram a trajetória econômica positiva e 6% que não souberam responder.

O quadro também impõe um desafio ao projeto de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2026, num cenário inflacionário que tem penalizado outros mandatários nas urnas — em países como Estados Unidos, Reino Unido, Coreia do Sul, Portugal e Uruguai, partidos de oposição de diferentes ideologias chegaram ao poder ou conquistaram maioria no Congresso no ano passado.

Procurado para comentar a tendência de estagnação do poder de compra mostrada pelo estudo, o Ministério da Fazenda não respondeu até a publicação desta reportagem.

‘Não voltaremos ao poder de compra pré-pandemia’

Para realizar o estudo, o economista Bruno Imaizumi, da LCA 4intelligence, usou a série histórica do valor da cesta básica na cidade de São Paulo produzida pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e o salário mínimo vigente.

Ele então projetou as duas séries à frente, a partir da estimativa da LCA para inflação de alimentos em domicílio em 2025 e 2026 e para o reajuste do salário mínimo segundo a nova regra.

Desde 2023, o salário mínimo é corrigido pela soma da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) em 12 meses até novembro e do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos anteriores.

A diferença é que agora há um teto de reajuste de 2,5% acima da inflação, a fim de adequar o crescimento do salário mínimo aos limites de gastos públicos definidos pelo novo arcabouço fiscal.

Desde 1998, início a série histórica da cesta básica do Dieese em São Paulo, até 2010, houve um ganho no poder de compra do brasileiro, mostram os dados.

Passando de um pouco mais de uma cesta básica por salário mínimo para 2,2 cestas básicas em janeiro de 2010.

No período entre 2010 e 2019, melhor momento para o poder de compra do brasileiro, o salário mínimo comprou em média 2,1 cestas básicas.

“O que o estudo mostra é que perdemos poder de compra a partir de 2020, quando entra a pandemia e os preços de alimentos ficam muito caros”, observa Imaizumi.

A partir de 2022, há a guerra entre Rússia e Ucrânia, com forte impacto sobre o preço global dos grãos, além de uma série de episódios climáticos cada vez mais extremos, que reduzem a oferta de alimentos, elevando preços mundialmente.

Com isso, o poder de compra do salário mínimo caiu para 1,5 cesta básica em abril de 2022.

Desde então, se recuperou ligeiramente, para 1,7 em novembro de 2024, mas sem retomar o nível anterior à pandemia.

“Os níveis de preços permaneceram muito elevados e, olhando para as nossas projeções, que estendem para frente as métricas de poder de compra, vemos que não há uma recuperação [nos próximos dois anos]”, diz o economista da LCA.

“Não voltaremos a patamares [de poder de compra] pré-pandemia, então o brasileiro ainda se sente lesado. Ele não consegue comprar o mesmo que comprava antes da pandemia, porque os níveis de preços permanecem muito altos.”

Imaizumi observa que, mesmo considerando a regra antiga de cálculo de reajuste do salário mínimo, o cenário pouco mudaria.

“O que pode ajudar para que haja uma recuperação um pouco mais contundente do poder de compra é uma valorização do real”, avalia o economista.

“Para isso, o governo vai precisar mostrar que está comprometido com a questão do ajuste fiscal, porque a trajetória das contas públicas brasileiras no médio e longo prazo é preocupante, o que afeta expectativas de investimento, consumo e crescimento a longo prazo do país.”

O analista lembra que, em 2024, a inflação de alimentos ficou bem acima da alta da inflação em geral medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Isso ocorreu em grande medida devido ao excesso de chuvas, seca e queimadas que afetaram as safras não só no Brasil, mas também em outros grandes países produtores de commodities agrícolas.

Para 2025 e 2026, Imaizumi espera que IPCA e a inflação de alimentos tenham variações mais próximas.

“Mas os preços de alimentos vão continuar elevados”, prevê o economista.

“Por mais que a gente tenha [em 2025] a perspectiva de uma safra próxima do recorde de 2023, o real desvalorizado incentiva a exportação, o que reduz a oferta de produtos no mercado doméstico.”

Além disso, diz ele, o real desvalorizado também afeta o valor das commodities negociadas em dólar no mercado internacional.

E as expectativas de inflação desancoradas em meio às preocupações fiscais também acabam influenciando a inflação de alimentos, lembra Imaizumi.

Efeito pêndulo

Para o economista, a permanência dos preços em patamar elevado após a pandemia pode ser um dos motivos que têm levado ao que é chamado na análise política de “efeito pêndulo”, ou a tendência de vitória da oposição em eleições recentes pelo mundo.

“O presidente de uma determinada ideologia se elege, mas não consegue recuperar poder de compra ou fazer a economia crescer de maneira robusta e sustentável, então não consegue se reeleger, mesmo com a máquina pública operando”, afirma.

Creomar de Souza, cientista político e diretor-executivo da consultoria de risco político Dharma Politics, avalia que, se as projeções de estagnação do poder de compra na segunda metade do mandato de Lula se confirmarem, ele pode de fato enfrentar dificuldades nas eleições de 2026.

“Tem uma frase que diz: ‘Se a geladeira está cheia, o voto é no governo. Se está vazia, o voto é na oposição’. Então o grande desafio da administração Lula na atual conjuntura é convencer as pessoas de que a economia está funcionando”, diz Souza.

“E esse não é só um desafio de comunicação. O desemprego está diminuindo, os salários estão aumentando, mas as pessoas não estão sentindo isso no mercado. Esse é o ponto.”

‘Grande desafio da administração Lula é convencer as pessoas de que a economia está funcionando’, diz Creomar de Souza, da Dharma Politics

Souza ressalta, no entanto, que as causas do problema podem estar além da capacidade do governo de remediá-lo e destaca que a inflação influenciou recentemente a eleição nos Estados Unidos, vencida por Donald Trump.

“Ou seja, é um problema global — os preços não voltaram ao que eram antes da pandemia aqui, na Europa, nos Estados Unidos, em todos os lugares”, diz o cientista político.

Souza observa ainda que a economia não é o único fator que ajuda a explicar a avaliação negativa que parte da população faz do governo Lula — no Datafolha mais recente, 35% dizem aprovar o governo petista, enquanto outros 34% reprovam, e 29% avaliam a gestão como regular.

O país segue profundamente fraturado politicamente, avalia o analista.

“Uma parcela importante da sociedade que não gosta do Lula, se o governo conseguir fazer chover maná do céu, vai continuar não gostando do Lula”, diz Souza.

“Isso gera uma dificuldade para o país como um todo, porque vai erodindo os consensos. Há uma dificuldade de transposição de dados positivos para a percepção de um número grande de eleitores.”

Diante desse dilema, o governo tem dois caminhos possíveis para o fim de mandato, na visão de Souza: tentar resolver o desafio fiscal que tem gerado uma crise de confiança nos mercados, impactando o câmbio e as expectativas de inflação, ou “jogar mais lenha na caldeira” e acelerar os gastos no fim do mandato mirando a reeleição — como tentou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e fracassou.

“O dilema para o governo Lula é frear as expectativas negativas, e isso passa por o governo ser mais homogêneo, ter mais consensos e ter sinalizações muito claras acerca do que quer fazer”, diz Souza.

Lembrando da crise de confiança durante o governo de Dilma Rousseff (PT), ele afirma que o passado recente mostra que não é uma boa ideia ir à guerra contra as forças de mercado.

“O Congresso e as forças políticas em Brasília sentem o cheiro de algo dando errado muito rapidamente — de fraqueza, de desgovernança ou de falta de consenso”, diz.

“À medida que esse cheiro é sentido, as forças políticas vão tentar tirar o proveito máximo disso, então, para cada medida que o governo precisa aprovar, o preço vai ficando mais caro. E um governo que gasta muito recurso no processo de negociação fica desprovido de recursos para fazer outras questões que importam.”

Classe média volta a ser predominante no Brasil após 9 anos

Por Danandra Rocha — Após quase uma década, o Brasil voltou a ser predominantemente um país de classe média. Os dados foram divulgados pela Tendências Consultoria. Os números evidenciam que, em 2024, 50,1% das residências brasileiras seriam classes A, B e C, com renda familiar mensal superior a R$ 3,4 mil. No último dado apresentado, o maior índice foi em 2015, quando 51% das famílias brasileiras preenchiam essa faixa de renda.

O crescimento econômico nos últimos anos, gerada por um recorrente aumento dos salários e com o fortalecimento do mercado de trabalho, foi uma das razões que determinaram essa transição. Segundo o levantamento, entre 2023 e 2024, houve um acréscimo de 3,6 milhões de novas vagas de empregos formais, levando ao impulso de renda entre as famílias e proporcionado um crescimento na evolução social.

Complementando os outros dados, que foram apresentados pelo estudo é o crescente aumento da massa total de renda, que se elevou, em média, 7% no ano de 2024. As famílias da classe C obtiveram uma renda maior de 9,5%, em um mesmo momento em que a classe B passava por um crescimento de 8,7%. Esses indicadores ultrapassam a média do país, evidenciando um impacto gradativo nas políticas econômicas e sociais.

Apesar dos números mostrarem saltos importantes, estudiosos advertem aos impasses que ainda predominam. A Tendências Consultoria imagina que haverá uma demora no ritmo de desenvolvimento na sociedade em 2025. O aumento e diversificação na renda da classe C, é esperado que seja de 6,4%, superando a média nacional de 3,8%, mas menos expressividade comparado aos anos anteriores.

Outrora, com o crescente aumento de trabalhos informais, desigualdades em salários entre homens e mulheres e com pouco investimento em educação, saúde e qualificações profissionais continuam como obstáculos para a estabilização dessa classe em desenvolvimento.

Com o aumento da classe média no país, a economia acende juntamente com o cenário social e político. Ao longo dos anos, a classe média determinou no consumo e no surgimento de novos setores da educação e saúde particulares, incentivando melhorias nos serviços públicos para uma melhor eficiência.

Economia e política: tempestade perfeita no horizonte

José Matias-Pereira — Economista, advogado, doutor em ciência política pela Universidade Complutense de Madrid e pós-doutor em administração pela Universidade de São Paulo. Professor e pesquisador senior do Programa de Pós-Graduação em ciências contábeis da Universidade de Brasília (UnB)

A economia e a política estão intrinsecamente ligadas, pois decisões econômicas têm implicações políticas, e decisões políticas impactam a economia. As políticas fiscais e monetárias são frequentemente moldadas pelas prioridades políticas dos governos. A economia fornece os recursos e as ferramentas para a tomada de decisões racionais, enquanto a política determina as prioridades e as estratégias para a alocação desses recursos.

Quando os governantes atuam de forma irresponsável, em geral, motivados por ideologia, populismo econômico ou má gestão (incompetência), essas duas dimensões — política fiscal e política monetária — entram em desequilíbrio, provocando prejuízos no funcionamento da economia e afetando as empresas e o bem-estar das pessoas. Os efeitos desses desajustes refletem no campo da política.

Nas democracias parlamentaristas, diante da gravidade da crise, o primeiro-ministro tende a cair, e o país avança para novas eleições. Nas democracias presidencialistas, em última instância, desaguam no afastamento do presidente, assumindo o vice-presidente. O Brasil vivenciou esse cenário de desequilíbrio que levou ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 31 de agosto de 2016.

Feitas essas considerações, formula-se a seguinte pergunta: O Brasil avança para vivenciar uma “tempestade perfeita” na economia e na política em 2025? Para respondê-la, torna-se relevante avaliar o cenário econômico e político nos âmbitos internacional e nacional. Constata-se, no plano internacional, uma profunda desorganização do sistema econômico e político mundial em decorrência dos conflitos latentes nesses campos entre a China e os EUA e dos efeitos das medidas de isolamento da Rússia em decorrência da invasão da Ucrânia, notadamente, pelos EUA e países da União Europeia. Esse cenário se agravou em 2024 com a eclosão dos conflitos no Oriente Médio, entre Israel e o Hamas (Palestina), no qual se envolveram os países que apoiam os grupos terroristas existentes naquela região, com destaque para o Irã.

Vislumbra-se que, neste ano de 2025, com base nas medidas tarifárias delineadas na plataforma eleitoral do presidente eleito dos EUA Donald Trump, o mundo avance para um cenário de “guerra” tarifária no comércio mundial. É oportuno destacar que o nível de impacto dessas medidas econômicas e políticas irá variar em função das realidades econômicas e políticas de cada país e da profundidade das medidas de retaliações adotadas pelo governo norte-americano. A aproximação do governo brasileiro com o eixo de países governados por ditadores, que se opõem aos EUA, poderá colocar o Brasil na lista dos países que irão sofrer fortes retaliações tarifárias.

O pessimismo sobre a trajetória da economia brasileira, percebida por grande parcela da população nas pesquisas de opinião (em especial, pela elevação da inflação), também aumentou de forma acentuada por parte do mercado em decorrência de decisões dúbias por parte do governo, em especial sobre a falta de vontade política do governo de reduzir as despesas e controlar o crescimento da dívida pública. Nesse sentido, as críticas e desconfianças com a consistência da política econômica do governo Lula tem como foco central o crescimento acelerado da Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG), calculada pelo Banco Central, ressaltando que esse indicador de endividamento é o mais utilizado pelos economistas e analistas para avaliação da sustentabilidade das contas públicas.

A determinação de elevar os gastos de forma descontrolada exigiu que o governo aumentasse as receitas, o que fomentou o crescimento da arrecadação de 4% em 2023 a 12% até outubro de 2024. As despesas cresceram 12% em 2023, e 10% em 2024. A DBGG passou de 71,7% do PIB em dezembro de 2022 para 74,4% em dezembro de 2023 (R$ 8,079 trilhões). Em 2024, estima-se que deverá alcançar 80%, o equivalente a R$ 9,1 trilhões. A estimativa para a DBGG em 2025 é de 82,2% do PIB, e de 84,1% do PIB em 2026.

Recorde-se que, em substituição ao teto de gastos, o governo Lula formulou um novo arcabouço fiscal que permite que as despesas cresçam junto da arrecadação de impostos. O aumento elevado de receita, no entanto, foi acompanhado pelo crescimento significativo de despesas. Assim, o arcabouço foi perdendo credibilidade junto ao mercado com a mudança das metas de resultado das contas públicas para os anos seguintes. É oportuno recordar que, em abril de 2024, quando o FMI projetou o Brasil fechando o ano como a oitava maior economia, o dólar estava cotado a R$ 5,18. No final do mesmo ano, a moeda fechou a R$ 6,44. Estima-se que o PIB do Brasil em 2024 deverá alcançar US$ 2,27 trilhões. Caso a desvalorização do real frente ao dólar continue aumentando, o Brasil está ameaçado de perder a sua posição entre as 10 maiores economias mundiais em 2025.

Diante desse cenário de incertezas, pode-se argumentar que o descontrole das contas públicas e a perda de autonomia do Banco Central fomentarão a formação, no médio prazo, de uma tempestade perfeita que irá se abater sobre a economia brasileira, tendo como fator impulsionador a dominância fiscal. Pode-se afirmar, por fim, apoiado na estreita relação que existe entre economia e política, que o desempenho da economia será fator decisivo — num contexto em que esteja prevalecendo a democracia e a transparência no sistema eleitoral — para a escolha do próximo presidente da República, nas eleições de outubro de 2026.

” name=”Botão para direita” aria-label=”Botão para direita”>