A partir de 2021, tornou-se clara a mudança nos regimes de política macroeconômica das principais economias avançadas, em relação ao período pós-crise financeira global de 2008.
Houve a mudança de uma tendência deflacionária por insuficiência crônica de demanda agregada para choques frequentes de restrições na oferta e um aumento da inflação. Isso levou ao fim da era de liquidez abundante e barata dos bancos centrais, resultando em taxas de juros mais altas e em “apertos quantitativos” por bancos centrais.
Como consequência, elevaram-se as preocupações com possíveis múltiplos choques financeiros. Além de buscarem equilibrar redução da inflação com manutenção de empregos, os bancos centrais e governos estão obrigados a manter vigília sobre a estabilidade financeira.
O desempenho macroeconômico refletiu a elevação das taxas de juros pelos bancos centrais. No caso dos Estados Unidos, o crescimento e o emprego se mostraram resilientes, enquanto a taxa de inflação desceu dos altos patamares que alcançou, mais recentemente mostrando lentidão para baixo.
O excesso de poupança das famílias, depois do volume extraordinário de transferências governamentais associadas à pandemia, assim como o retorno dos fluxos de imigração e a situação protegida de famílias com hipotecas com taxas fixas e baixas por 30 anos, em conjunto com déficits fiscais, explicam aquela resiliência.
Na área financeira, houve a turbulência bancária no ano passado. Contudo, não apenas boa parte do setor corporativo havia aproveitado a fase de liquidez disponível para alongar dívidas com taxas mais baixas que as que vieram a vigorar em mercados, como também os mercados acionários mais que recuperaram a forte queda de preços vivida em 2022.
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O resultado em termos de crescimento e inflação na Europa foi menos favorável, mas numa direção similar.
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De qualquer modo, as taxas de juros ajustadas pela inflação estão bem acima daquelas mínimas do período pós-crise financeira global, nos dois lados do Atlântico, enquanto o crescimento de médio prazo permanece fraco.
A novidade em termos de componentes do regime de políticas macroeconômicas nas economias avançadas vem do lado fiscal.
A sustentabilidade de uma dívida pública depende de quatro fatores-chave: saldos primários (excessos de receitas do governo sobre despesas, excluindo pagamentos de juros), crescimento econômico em termos reais, taxas de juros reais e os próprios níveis da dívida.
Saldos primários mais altos e crescimento ajudam a alcançar a sustentabilidade da dívida, enquanto taxas de juros e níveis de dívida mais altos jogam na direção oposta.
Durante muito tempo, a dinâmica da dívida permaneceu benigna, pois as taxas de juros reais estavam significativamente abaixo das taxas de crescimento. Isso reduziu a pressão para a consolidação fiscal e permitiu que déficits públicos e dívidas públicas aumentassem sem grande preocupação. Então veio o aumento durante a pandemia, por conta de grandes pacotes de apoio emergencial.
Como resultado, a dívida pública como fração do produto interno bruto aumentou significativamente em economias avançadas e emergentes. Estimativas do FMI sugerem que deverão atingir, respectivamente, 120% e 80% do PIB até 2028.
Tem-se, portanto, uma combinação de:
taxas de crescimento de médio prazo mais baixas, em decorrência de crescimento medíocre da produtividade, demografia menos favorável ao crescimento, baixos investimentos e cicatrizes da pandemia.
taxas de juros bem mais altas aumentando o custo de serviço da dívida pública, depois da subida de patamares de dívida desde a pandemia e de pacotes de incentivos fiscais. Mesmo que taxas “naturais” de juros (aquelas às quais uma economia opera em seu potencial enquanto a inflação se mantém estável) retornem a patamares mais baixos, as taxas de juros de longo prazo exigidas por compradores de títulos públicos incorporam um prêmio de risco que tende a subir nas novas circunstâncias.
Há um “novo normal” com custos de financiamento significativamente mais altos do que na última década.
Se melhorias nos saldos primários dos governos não puderem ser alcançadas para compensar taxas reais mais altas e crescimento potencial mais baixo, a dívida soberana continuará a crescer.
Isso também poderá trazer implicações para a saúde do setor financeiro. Taxas de juros mais altas, níveis mais altos de dívida soberana e uma parcela maior dessa dívida no balanço do setor bancário tornam o setor financeiro mais vulnerável.
Uma reconstrução gradual e crível de amortecedores fiscais que garantam a sustentabilidade de longo prazo de dívidas soberanas será apropriada no “novo normal” do regime de políticas macroeconômicas.
Valerá também a efetuação de testes de estresse que considerem os impactos sobre bancos e instituições não bancárias de taxas de juros soberanas mais altas, além de possíveis episódios de iliquidez de mercado.