O fatiamento dos ativos da TIM, alvo de tantas discussões, talvez seja a parte menos complexa da história. O que promete ser o nó górdio da operação é o esquartejamento e posterior partilha dos seus passivos – por passivos entenda-se a dívida propriamente dita e, sobretudo, os riscos jurídicos pendurados na empresa. Agora mesmo, em meio às intrincadas negociações para a venda do controle, a TIM está prestes a ter seu nome envolvido em um novo escândalo. Documentos recém-entregues à Justiça brasileira indicam que a operadora adotou uma série de expedientes que violam o Código de Defesa do Consumidor, notadamente o decreto do SAC, e normas estipuladas pela própria Anatel. As denúncias apontam para a gestão de Luca Luciani (foto), que dirigiu a empresa de 2009 a 2012.
Quem muito pisa no barro deixa rastros até por onde não anda. As novas denúncias contra a TIM têm origem num episódio que, a princípio, nada tinha a ver com a companhia. A Hoje Telecom, operadora de telefonia focada no mercado corporativo, entrou com uma ação contra a Telcomp – Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas. A empresa rompeu com a entidade por discordar de regras para cobranças de serviços e atendimentos de assinantes em vigência no setor. O que aparentemente seria apenas uma briga de paróquia acabou batendo no alto clero da operadora italiana. A Hoje Telecom teve acesso a cada uma das 14.316 páginas (sem contabilizar os anexos) do inquérito em curso na Procuradoria de Milão, que investiga o chamado escândalo dos “SIM Card” – a Telecom Italia é acusada de ter habilitado milhares de linhas de celulares de forma irregular.
Documentos entregues à 21ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal revelam práticas lesivas ao consumidor adotadas pela TIM. O processo traz anexado um e-mail que Luciani enviou a dirigentes da operadora antes mesmo de assumir a presidência da empresa. O executivo elenca uma série de procedimentos que os atendentes da TIM deveriam adotar para evitar o cancelamento de linhas. O manual de ataque ao consumidor inclui “declarar que os dados cadastrais estão incompletos”, “reduzir a transparência e informações” e “exercer pressão no caso de faturas negativas”. Luciani determina que a empresa procure formas de inclusão automática do assinante nas “listas negras de crédito”. O fato de uma prestadora de serviços tentar agarrar a unha clientes fugidios não chega a ser um fato de outro mundo. Estranho seria se a TIM nada fizesse para reter seus assinantes. O que chama a atenção é a extensão das medidas propostas por Luciani e, principalmente, a suposta confissão do crime.
A gestão Luciani está visceralmente ligada aos riscos que rondam a TIM. Uma das caixas pretas da operadora são os critérios de provisionamento para potenciais riscos, notadamente tributários, adotados desde 2009. Hoje, o balanço aponta contingências da ordem de R$ 9,3 bilhões classificadas como possíveis perdas. A maioria esmagadora é de natureza fiscal: R$ 8,1 bilhões. Neste caso, no entanto, as provisões somam apenas R$ 184 milhões, o correspondente a 2%. A TIM sempre manteve como padrão uma provisão para potenciais dívidas fiscais na casa dos 10%. Se o zelo persistisse, dificilmente a empresa conseguiria pagar R$ 750 milhões em dividendos em 2013. Pela equivalência patrimonial, seriam R$ 500 milhões a menos no caixa do acionista controlador.
Fonte: Relatório Reservado