ENID CÂMARA, presidente da Associação Brasileira de Empresas de Eventos (Abeoc Brasil)
Eu poderia apostar que você, talvez, não saiba ao certo em quantos eventos corporativos esteve presente. Difícil lembrar de todos, não? Eu entendo, mas o fato é que, todo ano, a gente encontra um tempo para estar em algum evento corporativo. Os eventos simplesmente fazem parte da nossa agenda, da nossa vida profissional!
E por quê? Porque um homem nos fez passar a pensar assim: o radialista e empresário Caio de Alcântara Machado (1926-2003). Foi ele que, no ano de 1958, resolveu criar a Feira Nacional da Indústria Têxtil (Fenit), em São Paulo. E não à toa é considerado o criador das feiras de negócios no Brasil, o pioneiro do nosso setor de eventos.
Mas agora imagine como Caio reagiria ao ver todo esse setor ser dizimado por uma pandemia? Não, ele não merecia ter visto milhares de empresas e profissionais forçadamente parados por dois longos anos. E de lembrar que, em 2019, o setor de eventos crescia 19% ao ano, com previsão de chegar aos 25% em 2020. Mas não foi possível. A covid-19 não nos permitiu esse crescimento.
A histórica e desafiadora pandemia levou ao fechamento em massa das empresas de eventos e, por consequência, a dispensa de quase 100% dos funcionários e prestadores de serviços de boa parte dos mais de 50 segmentos que compõem o ecossistema da cadeia de eventos. É impossível calcular quantos sonhos de prosperidade no setor foram interrompidos, quantos profissionais se sentiram obrigados a buscar outro meio de vida.
Naquele momento, a Associação Brasileira de Empresas de Eventos (Abeoc Brasil), enquanto mais longeva entidade do setor, fez coro ao chamado G20 , o grupo formado pelas principais entidades do trade de eventos e turismo do país. E após um ano e meio de muitas negociações, entre o setor produtivo e o governo federal, chegamos, em março de 2021, à criação do inédito Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).
O Perse foi o único programa criado pelo governo federal durante a pandemia para um setor específico da economia brasileira. Um merecido acerto em cheio para as tão impactadas empresas do setor buscarem sobrevida com o refinanciamento de dívidas e a isenção de impostos federais (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS).
Tais benefícios foram implementados com o cristalino propósito de reduzir as comprovadas perdas do setor. Um propósito com data de validade, é verdade. O Perse foi pensado para chegar ao fim exatamente em 17 de março de 2027. Ou seja, uma data estipulada com a mútua convicção dos empresários e do governo, pois o horizonte da referida data se traduziria em tempo hábil para a recuperação do setor no Brasil.
É como um médico que receita para o paciente uma série de atividades a serem cumpridas em determinado período. E, assim, acredita que, naquele tempo estabelecido, o paciente conseguirá se recuperar plenamente. Mas e se de repente aparece outro médico refutando o que foi prescrito para simplesmente reduzir o tempo de tratamento?
Analogias à parte é o que está acontecendo com o setor de eventos no Brasil. O tratamento aprovado para ser aplicado até 2027 pode, agora, ir somente até abril deste ano. E, aí, eu me pergunto: pode mesmo esse setor se recuperar em apenas dois anos. E para que serviram todos os estudos formulados para a validação do Perse até 2027? Estavam errados todos os profissionais que atestaram ser esse o tempo necessário para a recuperação de todo o setor?
Sofrem as empresas e os profissionais de eventos, bem como todos os stakeholders que orbitam em torno desse importante setor da economia brasileira. Sim, nossa atividade é puramente transversal! Pois dialoga e gera emprego com uma série de segmentos. Desde a indústria, que precisa dos congressos e feiras para lançar seus produtos ao setor de infraestrutura e logística que transporta tudo aquilo que é necessário para realizarmos eventos em todas as regiões deste continente chamado Brasil.
Por isso, é nítido perceber o tamanho do prejuízo que pode vir a ser causado a inúmeros ramos da nossa economia com o apressado e prematuro fim do Perse. É imperativo que todos parem e reflitam quem quando falamos em eventos, estamos tratando de todo um ecossistema formado por várias cadeias de valor conectadas uma à outra.
Ou seja, dizer “não” ao Perse, agora, é ignorar a transversalidade de um setor que gera emprego e renda para o turismo, para a indústria e para a logística. Deixemos o setor se recuperar, evitemos o desemprego. Nos deixem preservar o legado de Caio de Alcântara Machado, nos deixem seguir investindo nas feiras e eventos do Brasil.
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