Presidente do Grupo Libra analisa momento do setor portuário

grupo libra2A economia brasileira neste final de ano e no início de 2015 ainda enfrenta um cenário “desafiante”, mas deve se recuperar gradualmente. Neste contexto, o aspecto mais importante é o potencial do mercado brasileiro, que ainda tem muito o que crescer, especialmente no setor de comércio exterior e, consequentemente, no segmento portuário.

A análise é do presidente do Grupo Libra, Marcelo Araujo, entrevistado desta semana da série 2015 em Análise – que A Tribuna publica aos domingos, até o início de janeiro, trazendo sempre um empresário de destaque avaliando o cenário econômico brasileiro.

Há seis anos à frente de um dos principais grupos de operação portuária e logística do País, com terminais nos portos de Santos (T-33, T-35 e T-37), Rio de Janeiro e Imbituba (SC), Araujo fala sobre suas expectativas para o Brasil e destaca por que mantém uma visão otimista sobre o segmento portuário, apesar de reconhecer a necessidade de ajustes no marco regulatório, a Lei 12.815/2013. Confira outros trechos da entrevista a seguir.

Qual sua expectativa para a economia brasileira neste final do ano e em 2015?

A visão que nós temos hoje é de que o cenário internacional não está tão ruim. É claro que nós temos sinais preocupantes na Europa, mas eles estão dentro do que nós imaginávamos que iriam ser. Talvez tenha tido um pouco de otimismo no primeiro semestre, com a recuperação da economia americana, que agora se contrabalançou com notícias piores na Europa. Mas já se imaginava uma recuperação bem gradual do comércio internacional. Isso não vai mudar muito. Continuamos mantendo nossa leitura de que a economia internacional vai ter uma recuperação gradual. Não apresentará problemas maiores do que nós temos hoje. Nos preocupa muito, na verdade, a queda do comércio internacional brasileiro de produtos acabados, industrializados, que é o que impacta a atividade do contêiner.

De quanto foi essa queda?

Ela foi muito significativa nos primeiros seis meses do ano. A movimentação total de contêineres aumentou no primeiro semestre 2%, 3%. Mas isso foi por que aumentaram (as operações de) cabotagem e transbordo. Se você expurgar o transbordo e a cabotagem, teve uma queda de 3% a 5% no contêiner cheio de exportação e no contêiner cheio de importação, no primeiro semestre. Isso é uma coisa que preocupa pois, primeiro, mostra um desaquecimento da economia no lado da importação de bens industrializados ou insumos para industrialização – peças, equipamentos, máquinas, que normalmente vêm conteinerizados, pela proteção à carga. E por outro lado, mostra que nós não estamos conseguindo dar uma resposta ao cenário internacional, principalmente a clientes tradicionais, consumidores de produtos acabados, como Europa e Estados Unidos. Este número (de queda) nos surpreendeu. Não esperá vamos uma redução grande.

Qual era a expectativa inicial?

Esperávamos um crescimento de 5% a 7% no ano no volume de contêineres cheios. E no primeiro semestre, veio uma queda. Isso é um sinal complexo. O que gera o volume econômico não é o transbordo. O transbordo acontece porque a carga de contêiner cheio está vindo ou está indo e você a concentra. Quanto mais volume de contêiner cheio você tem, mais transbordo você tende a fazer. Você traz navios maiores e redistribui. E cabotagem é consumo doméstico. O foco de Santos é comércio exterior, mas Santos é um grande porto de cabotagem também, por que a carga sai daqui e vai para outro estado e São Paulo consome mercadorias de outros estados. Veja que o número total de cheios no mercado, no primeiro semestre, na importação, caiu 2,5%, e, na exportação, 6,9%. O volume total cresceu 3%, mas os cheios de importação e exportação caíram 4,5%. São todos dados da Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários).

E qual a expectativa para este segundo semestre?

Não estamos sentindo uma recuperação do volume ainda. O terceiro trimestre foi mais ou menos no mesmo nível do segundo, o que não era esperado. O segundo tinha Copa e outras questões. Não tenho os dados do Brasil ainda, mas o volume dos nossos clientes, os serviços que fazem escala com a gente não cresceram como se esperava. Talvez agora no quarto trimestre cresça um pouco mais.

O que já é esperado, não?

Na verdade, essa recuperação começa no final de agosto. E nós temos conversado com os armadores e, da parte deles, também houve uma frustração.

Que balanço o sr.faz de 2014?

Sobre a economia, está difícil dizer o que vai acontecer. Mas é pouco provável que passe de 0,5% de crescimento. Mesmo que seja 1%, é uma frustração em relação à expectativa do início do ano. Trabalhar nas causas desse baixo crescimento é obrigação do próximo governo.

Qual o motivo desse baixo crescimento?

É difícil dizer porque não tem uma causa específica. Há dois índices que mostram o potencial que o Brasil tem.Um deles é o índice de conteinerização e o outro é o índice de inserção no comércio exterior, que, na verdade, é a soma das importações e das exportações, dividida pelo total do PIB. E ele ainda é muito baixo em relação ao tamanho da nossa economia. Então você tem um espaço enorme para crescer no índice de troca global. No outro lado, você ainda tem muita carga no Brasil para ser conteinerizada. Com isso, nossas projeções de crescimento para os volumes de contêiner tendem a ser maiores do que as do crescimento do PIB. Se eu tenho um baixo índice de inserção na economia global, à medida que eu vou crescendo, eu vou me inserindo mais nas trocas globais. Então esse índice deve crescer mais do que o crescimento do PIB. Se o PIB cresce a 2%, o comércio exterior deveria crescer a 3%, 4%. E nós ainda temos muito espaço para crescer na conteinerização, pois é uma carga mais fragmentada. É a carga geral, a carga industrializada, de maior valor agregado. E esse aumento ajuda a contrabalançar o fluxo de contêineres vazios nas duas direções.

Como?

Se você está importando mais, você tem contêineres vazios aqui e eles têm de ser reposicionados para lá. Isso abre espaço para reduzir o custo de exportação da indústria brasileira. O círculo é virtuoso nesse sentido. Eu aumento a importação, eu trago mais contêineres. Quando esses contêineres retornam vazios, você acaba tendo uma oferta de fretes mais baratos para a exportação. O contêiner, então, reduz o custo da exportação brasileira. O aumento da importação de produtos industrializados reduz o custo da exportação dos produtos industrializados. Essa é a visão que manda aqui. Essa visão é mais importante para nós do que a visão de curto prazo. Então eu tenho um potencial grande de inserção do Brasil no mercado internacional. Tenho um potencial grande de conteinerização n o Brasil. E se o Brasil crescer a 4%,você pode esperar um crescimento do contêiner de 10% fácil. Nós estamos com US$ 11 mil de renda per capita. Até você chegar ao patamar dos US$ 20 mil, US$ 24 mil, que é o target (alvo) que nós vemos hoje para o Brasil, você imagina o quanto de crescimento de renda tem aí, o quanto de inserção do Brasil na economia mundial poderá haver, o quanto de crescimento do contêiner tem em potencial. Essa é a nova visão do mercado de contêineres. Por isso a gente segue investindo, independentemente do cenário de curto prazo, que é mais desafiante.

Então a longo prazo, as perspectivas são mais animadoras?

Sim. Os investimentos que a gente faz são investimentos que retornam em 10, 12 anos. Não adianta eu olhar para o ano que vem. Pelo contrário, é nesse momento que é a hora certa de investir, já que (o porto) não está tão cheio mesmo.

Pois o impacto na operação é menor?

Sim. Há desafios a curto prazo, neste segundo semestre e no início do ano que vem. Mas continuamos acreditando muito na economia brasileira. Acreditamos tanto que estamos acabando um investimento no Rio de Janeiro muito significativo. A obra já foi entregue, recebemos os equipamentos. São 12 RTGs e dois portêineres post-panamax, que são os maiores do Brasil. E, até o final de dezembro, estarão todos comissionados. Em janeiro, teremos 70% a mais de capacidade no Rio do que há um ano. E ainda temos mais R$ 200 milhões para investir. E em Santos, temos o nosso projeto de R$800 milhões, para a unificação dos três terminais (T-33, T-35 e T-37). Veja que não paramos de investir.

O projeto de Santos depende da negociação com o Governo Federal?

Sim, que está andando em paralelo. Ela está até bastante bem, tanto que a Antaq está avaliando nosso processo de renovação (antecipada de arrendamento). A equipe da Antaq esteve aqui recentemente.

O novo marco regulatório, a Lei 12.815/2013, deu um grande impulso aos terminais privados.Alguns especialistas temiam até que os terminais públicos não fossem atrair mais investimentos. Com esses projetos no Rio e em Santos, a Libra parece pensar o contrário. O quão atrativos são os portos públicos hoje?

Eu concordo em parte com essa visão (sobre o novo marco regulatório). Acho que ainda tem melhorias que precisam ser feitas no marco regulatório, viabilizando os portos públicos. O porto público é um patrimônio da sociedade.Você não pode sucatear isso dizendo que agora só haverá investimento em porto privado. Se for assim, então é melhor privatizar o Porto de Santos. Veja, nós

podemos investir e vamos investir em portos privados também, o que não quer dizer que a gente não deve investir em porto público.

O marco regulatório colocou isso em risco?

Eu diria que não. Não acho que vai acabar o porto público. Mas eu acho que a regulamentação é muito importante e que está havendo, nesse momento, um excesso de regulamentação. Ela aumenta o custo e, portanto, impacta a eficiência. A gente tem que ter regras mais equilibradas entre os custos dos portos públicos e dos privados, para que não se desestimulem futuros investimentos. São ajustes que precisam ser feitos. E eu acho que o Governo já está se preparando para fazer isso. Já há um diálogo. Nesse momento, nós estamos focados nas expansões e nas oportunidades de licitação que vão surgir.

Mas estamos estudando projetos de longo prazo em outras regiões. Longo prazo?

Uns cinco anos. Nesse período, vamos focar nas próximas licitações. Somente depois desse ciclo de investimento, vão entrar os projetos de longo prazo.

Fonte: A Tribuna Online

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